quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Seja muito bem vindo!

Todas as vezes que minhas convicções passam por alguma tipo de abalo eu posso ir a Deus, n'Ele os meus medos e as minhas dúvidas se dissipam; a fé se renova na presença divina.
Cada vez que outros discursos tentam obscurecer as certezas do Evangelho Social e me trazer "estranhos conceitos", eu vou aos escritos de Wesley, neles encontro a suma de décadas de estudo e meditação, no seu gigantismo espiritual me inspiro, na história da sua rotina de oração e serviço, sou conduzido novamente às fileira dos que servem e são felizes por servirem a Deus servindo a cada um dos pequeninos que diariamente acercam-nos e estendem a mão; sequiosos de Deus, sedentos de tudo.
Sou metodista logo depois de ser cristão!
                                                                               magno aquino

domingo, 4 de outubro de 2009

Desperta, tu que dormes


DESPERTA, TU QUE DORMES

Pregado no domingo, 4 de abril de 1742, perante a Universidade de Oxford.
“Desperta, tu que dormes, e levanta-te dentre os mortos, e Cristo te alumiará”.
(Efésios 5.14)
DISCORRENDO sobre estas palavras, pretendo, -com o auxílio de Deus,
1º— Descrever os adormecidos, a quem as palavras do texto se dirigem;
2º— Corroborar a.exortação — “Desperta, tu que dormes, e levanta-te dentre os mortos”; e
3º— Explanar a promessa feita aos que despertam e levantam-se: “Cristo te alumiará”.

I

1. Primeiramente, tratemos dos adormecidos aí citados. De sono se entende ser o estado natural do homem, mergulhado naquela profunda inconsciência de alma; na qual o pecado de Adão infundiu tudo quanto havia em suas entranhas: a indolência, a preguiça, a incompreensão, a insensibilidade no tocante à sua condição real, estado este que é próprio de todo homem que vem ao mundo, perdurando até que a voz de Deus o desperte.
2. “Aqueles que dormem, dormem de noite”. O estado natural do homem é de profunda obscuridade, lembrando a condição segundo a qual “as trevas cobrem a terra e noite densa envolve o povo”. O pobre pecador ainda não despertado, qualquer que seja a extensão dos conhecimentos que possua acerca de outras coisas, não se conhece a si mesmo: neste sentido “ele nada sabe do que devia saber”. Não sabe que é um espírito decaído, cuja necessidade primacial, no mundo presente, é reerguer-se de sua queda e recuperar a imagem de Deus, segundo a qual fora criado. Não percebe a falta da única coisa necessária, isto é, a mudança interior de alcance universal, aquele “nascer de cima” simbolizado pelo batismo, que é o início da renovação total; aquela santificação de espírito, alma e corpo, “sem a qual ninguém virá a
Deus”.
3. Carregado de todas as enfermidades, julga-se, todavia, em perfeita saúde. Encarcerado em prisões de aço e de miséria, protesta estar em liberdade. Ele diz: “Paz, Paz!”, enquanto o diabo, como “um forte homem armado”, está de plena posse de sua alma. Dorme placidamente, descansa, enquanto o inferno se move sob seus pés para lhe vir ao encontro; enquanto o abismo, de onde ninguém jamais regressa, abre suas fauces para o tragar. Arde o fogo em torno de si, e ele não o pressente; queima-o, e apesar de tudo ele nada percebe.
4. Por adormecido entendemos, pois, (e prouvera a Deus que todos nós o compreendêssemos do mesmo modo!) o pecador satisfeito com seus pecados; contente com o permanecer em seu estado de queda, com o viver e morrer sem nunca refletir a imagem de Deus; o que ignora sua enfermidade e o remédio único que o pode curar; o que nunca foi advertido ou que nunca atentou para a voz de Deus que o aconselha a “fugir da ira vindoura”; o que jamais notou que estava exposto ao perigo do fogo do inferno ou que jamais clamou do mais profundo de sua alma: “Que devo eu fazer para me salvar”?
5. Se o que dorme não for exteriormente viciado, seu sono será, habitualmente, o mais profundo de todos: quer seja ele do espírito de Laudicéia, “nem frio, nem quente”, mas um pacífico, racional, inofensivo, prestimoso adepto da religião de seus pais; quer seja zeloso e ortodoxo e, “conforme a mais rigorosa seita de nossa religião”, viva como “um fariseu”, isto é, de acordo com o perfil farisaico da narrativa néotestamentária; quer seja como o que a si mesmo se justifica, trabalhando por estabelecer sua própria justiça como fundamento de sua aceitação por parte de Deus, — profundo lhe decorrerá o sono!
6. Assim é aquele que, “tendo a forma da piedade, nega o poder dela”; e ainda provavelmente a ultraja, onde quer que ela se manifeste, qualificando-a como simples extravagância e pura ilusão. Entretanto, o infeliz enganador de si mesmo dá graças a Deus porque “não é como os demais homens, que são adúlteros, injustos e ladrões”: não, ele não faz mal a ninguém. “Jejua duas vezes por semana”, usa de todos os meios de graça, é assíduo à igreja e aos sacramentos e “paga o dizimo de tudo quanto tem”; faz todo o bem que está em suas mãos fazer; “no tocante à justiça da lei”, ele é “irrepreensível”; nada lhe falta de piedade, mas de poder; nada lhe falta de religião, mas de espírito; nada lhe falta de cristianismo, mas de verdade e vida.
7. Não sabe, entretanto, o cristão desse tipo, que, por mais altamente estimado que possa ser em meio dos homens, é, todavia, abominação à vista de Deus e herdeiro de todos os ais com que o Filho de Deus denunciou ontem, verbera hoje e estigmatizará para sempre os “escribas e fariseus hipócritas?” É ele que “limpa o exterior do copo e do prato”, deixando seu interior cheio de roda imundície. “Uma enfermidade horrível pesa ainda sobre ele, de sorte que seu interior é deplorável”. Nosso Senhor com propriedade o compara a um “sepulcro branqueado”, que “parece formoso por fora”, mas, não obstante a, boa aparência, “está cheio de ossos e de toda podridão”. Os ossos, a bem dizer, não estão secos; os nervos e as carnes recobrem-nos, e exteriormente os envolve a pele; neles não há, porém, sopro; nada do Espírito do Deus vivo. E, “se alguém não possui o Espírito de Cristo esse tal não é dele”. “Vós sois de Cristo, se é que o
Espírito de Deus habita em vós”; mas, se isto não se dá, Deus sabe que estais ainda mortos.
8. Este é outro característico do adormecido de que fala o texto: ele habita o mundo dos mortos, embora não o saiba. Está morto para Deus, “morto em delitos e pecados”. Porque, “ter a mente carnal é estar morto”. Corno está escrito: “Por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte; assim a morte, passou a todos os homens”, não só a morte temporal, mas também a morte espiritual e eterna. “No dia em que comeres, desse Deus a Adão, tu certamente morrerás”: não corporalmente (a não ser que se leve em conta que ele então se tornou mortal), mas espiritualmente: perderás a vida de tua alma; morreras para Deus; serás separado dele, que é a vida essencial e a felicidade.
9. Deste modo foi primeiro dissolvida a união vital de nossa alma com Deus; de sorte que, “em meio da vida natural, estamos agora em estado de morte espiritual”. Neste estado permaneceremos até que o Segundo Adão se torne para nós em Espírito vivificante; até que ele levante o morto, morto em pecado, em prazeres, riquezas e honras. Mas, antes que qualquer alma possa viver, o pecador primeiro “ouve” (preste atenção) “a voz do Filho de Deus”: toma-se sensível a seu estado de perdição e recebe a sentença de morte. Reconhece estar “morto, conquanto viva”: morto para Deus e para todas as coisas de Deus, não tendo mais força para praticar as ações de um cristão vivo do que o corpo morto tem-na para cumprir as
funções do homem vivo.
10. E ainda mais certo é que o morto em pecados não tem os “sentidos exercitados para discernir espiritualmente o bem e o mal”. “Tendo olhos ele não vê; tendo ouvidos, não ouve”. Não “prova e vê que o Senhor é benigno”. Ele “jamais viu a Deus”, nem “ouviu sua voz”, nem tocou o Verbo da vida”. Em vão ressoa em torno o nome de Jesus, “como ungüento derramado e todo seu vestuário três calando mirra, aloés e cássia”: a alma que dorme o sono da morte não tem percepção de nenhuma coisa dessa espécie. Seu coração “perdeu o sentimento” e nada compreende desses fatos.
11. Desprovido, assim, de senso espiritual, não retendo o conhecimento espiritual, o homem natural não recebe as coisas do Espírito de Deus; e tão longe está de as aceitar, que aquilo que se discerne espiritualmente lhe soa como loucura. Não contente de ser profundamente ignorante das coisas espirituais, ele nega mesmo a existência delas. A própria sensibilidade espiritual lhe parece ser a loucura das loucuras. “Como— pergunta ele —podem ser essas coisas? Como pode algum homem saber que está vivo para Deus?” Do mesmo modo que sabes que teu corpo está agora vivo. A fé é a vida da alma; se tu tens esta vida palpitante em ti, não tens necessidade de sinais para evidenciá-la a ti mesmo, pois que a ελεγχος πνεύματος, aquela divina consciência, testifica de Deus, o que é mais do que dez milhares de testemunhos humanos— e de mais valia que todos eles.
12. Se o Espírito não testifica, no presente, com teu espírito, seres filho de Deus, que Ele te convença, a ti, pobre pecador ainda não despertado, pela demonstração de seu poder, de que tu és filho do diabo! Oh! Se produzissem agora “um rumor e um estremecimento”, e “os ossos se reunissem, achegando-se cada osso a seu osso!” Então, “Vinde dos quatro ventos, ó Sopro! E soprai estes despojos para que revivam!” E não endureçais vossos corações, resistindo ao Santo Espírito, que agora, vem convencer-vos de pecado, “porque não credes no nome do Unigênito Filho de Deus”!

II

1. Assim, “desperta, tu que dormes, e levanta-te dentre os mortos”. Deus agora te chama pela minha boca e ordena que conheças por ti mesmo, tu, espírito decaído, teu verdadeiro estado e a coisa única que te importa sobre a terra. “Que esperas tu, ó adormecido? Levanta-te! Invoca a teu Deus, para que teu Deus atente para ti e não pereças.” Uma tempestade brava se forma por cima de ti— e tu estás assentado nasprofundezas da perdição, no abismo dos juízos de Deus! Se queres escapar a esses perigos, arranca-te do meio deles. “Julga-te a ti mesmo e não serás julgado pelo Senhor”.
2. Desperta, desperta! Levanta-te neste momento, para que não aconteça teres de “beber, pela mão do
Senhor, a taça de seu furor”. Move-te ao encontro do Senhor, para que o Senhor, tua justiça, te possa
salvar! “Levanta-te do pó”. Enfim, que o terremoto da tempestade de Deus te abale. Desperta, e clama com o tremor do carcereiro: “Que devo fazer para ser salvo?” E não descanses nunca até creres no Senhor Jesus com uma fé que é dom da parte dele, pela operação do Espírito.
3. Se a qualquer de vós, mais do que a outro, falo, é a ti, que pensas nada ter com esta exortação, que particularmente me dirijo. “Tenho para ti uma mensagem de Deus”. Em seu nome eu te conjuro a “fugires da ira vindoura”. Vê, alma ímpia, tua imagem no condenado Pedro, assentado na masmorra escura, entre soldados, ligado com duas cadeias, sentinelas postadas em frente à porta, guardando a prisão. A noite vai muito alta, a manhã se aproxima, quando serás levado à execução. E, em tais circunstâncias mortais, tu dormes, dormes profundamente nos braços do diabo, à borda do abismo, nas fauces da perdição eterna!
4. Que o anjo do Senhor desça sobre ti e a luz resplandeça em tua prisão! E possas tu sentir a caricia da mão poderosa erguendo-te a segredar: “Levanta-te depressa, cinge-te, calça tuas sandálias, toma teus vestidos e segue-me”.
5. Desperta, espírito eterno, de teu sonho de felicidade terrena! Não te criou Deus para si mesmo? Logo, não podes encontrar repouso até que nele descanses. Volta, viandante! Voa para tua arca! Este não é o teu lar. Não penses em construir tabernáculos aqui. Não és senão um peregrino sobre a terra, a criatura de um dia, em trânsito para um destino imutável. Apressa-te! A eternidade está próxima. A eternidade depende deste momento— uma eternidade feliz ou uma eternidade de miséria.
6. Em que estado se acha tua alma? Se Deus, enquanto estou falando, ta exigisse, estarias pronto a te encontrares com a morte e com o juízo? Podes permanecer à sua vista, que é a de “olhos demasiadamente puros para verem a iniqüidade?” Estás pronto “a seres participante da herança dos santos em luz?” Combateste “o bom combate e guardaste a fé”? Tomaste posse da única cosa que é necessária? Recobraste a imagem de Deus, em justiça e verdadeira santidade? Despojaste-te do homem velho, para te revestires do novo homem? Estás unido a Cristo?
7. Tens óleo em tua lâmpada, graça no coração? Amas “ao senhor teu Deus de todo teu coração, e de toda tua mente, e de toda tua alma, e de todas as tuas forças?” Há em ti aquela mente que havia também em Cristo Jesus? És na verdade cristão, isto é, uma nova criatura? O que era velho passou e agora se fizeram novas todas as coisas?
8. “És participante da natureza divina?” Não sabes que “Cristo está em ti, a não ser que sejas reprovado?” Não sabes que Deus “habita em ti e tu em Deus, pelo Espírito que ele te concedeu”? Não sabes que “teu corpo é templo do Espírito Santo, que tu tens mediante comunicação da parte de Deus?” Tens o testemunho em ti mesmo— penhor de tua herança? “Recebeste o Espírito Santo” ou te surpreendes com a pergunta, nem sabendo “sequer que haja um Espírito Santo”?
9. Se te ofendes, estejas descansado: tu nem és cristão, nem desejas sê-lo. Até mesmo tuas orações se volvem em pecado, e tens solenemente zombado de Deus neste dia, suplicando a inspiração de seu Espírito Santo, quando nem crês que haja uma tal coisa a ser comunicada!
10. Sim, firmado na autoridade da palavra de Deus e de nossa Igreja, repito a pergunta: “Recebeste o Espírito Santo?” Se não o recebeste, ainda não és cristão, porque— cristão é o homem “ungido com o Espírito Santo e com poder”. Não te fizeste ainda participante da religião pura e imaculada. Sabes que religião é esta? É a participação da natureza divina; a vida de Deus na alma humana; Cristo formado no coração; “Cristo em ti, a esperança da glória”; felicidade e santidade; o céu começando na terra; “o Reino de Deus em ti”, consistindo, não em comida, nem em bebida, nem em coisas materiais, mas em “justiça, e paz, e gozo no Espírito Santo”; um reino eterno estabelecido em tua alma; a “paz de Deus, que excede a toda compreensão”; um “gozo indizível e cheio de glória”.
11. Sabes que “em Jesus Cristo, nem a circuncisão vale corsa alguma, mas a fé que opera por amor”, mas
o ser uma nova criatura? Sentes necessidade de mudança interior, de nascimento espiritual, de vida que tome o lugar da morte, —da santidade? Estás profundamente convencido de que sem esta ninguém verá a Deus? Estás trabalhando por alcançá-la, “usando de toda diligência para fazer certa tua vocação e eleição”, “operando tua salvação com temor e tremor”, e “agonizando por entrar pela porta estreita?” Estás ansioso acerca de tua alma? E podes dizer ao Escrutador de corações: “Tu, ó Deus, és o que eu esperava desde muito tempo! Senhor tu sabes todas as coisas! Tu sabes que eu quero amar-te”!
12. Esperas ser salvo; mas que razões tens a dar da esperança que há em ti? Será porque não causaste prejuízo, ou porque fizeste grande cópia do bem, ou porque não és como os demais homens, mas sábio, ou erudito, ou honesto e moralmente bom, estimado do povo e de reputação ilibada? Ai! A soma de tudo isso jamais te levará a Deus. A sua vista isso é tão vão como a própria vaidade. Não conheces a Jesus Cristo, a quem Deus enviou? Não te ensinou ele que “pela graça sois salvos pela fé; e isto não vem de vós: é dom de Deus; não vem das obras, para que nenhum homem se glorie?” Como fundamento de toda tua esperança, não recebeste a palavra fiel, segundo a qual “Jesus Cristo veio ao mundo para salvar os pecadores?” Não compreendeste o que significa: “Não vim chamar os justos, mas os pecadores ao arrependimento; não fui enviado senão à procura da ovelha perdida?” Estava tu (o que ouve, entenda), perdido, morto, condenado em outro tempo? Não reconheceste teu desamparo, não sentiste tuas misérias? És “pobre de espírito”, clamando por Deus e recusando todo conforto? És o pródigo que “cai em si mesmo”, ficando bem contente de ser daí por diante considerado “fora de si” por aqueles que ainda se alimentam das bolotas que ele deixou? Desejas viver piamente em Cristo Jesus, estando por esta causa sofrendo perseguição? Dizem os homens falsamente toda sorte de mal contra ti, por causa do Filho do Homem?
13. Que, através de todo este interrogatório, ouças a voz que desperta o morto e sinta o martelar da Palavra que despedaça as rochas! “Se ouvirdes sua voz neste dia, que se chama hoje, não endureçais osvossos corações”. Agora, “desperta, tu que dormes” na inconsciência da morte espiritual, para que não durmas no tormento da morte eterna! Reconhece teu estado de perdição e “levanta-te da morte”. Deixa teus velhos companheiros no pecado e na morte. Segue a Jesus, e “deixa que os mortos enterrem os seus mortos”. “Salva-te desta geração perversa”. “Sai do rio deles e separa-te, e não toques as coisas impuras, e o Senhor te recebera”. “Cristo te alumiará”.

III

1. Chego a ponto de explana, finalmente, esta promessa. E quão encorajadora é a consideração de que, quem quer que sejas que obedeças à chamada de Deus, não terás buscado em vão a sua face! Se tu agora “despertas e te levantas da morte”, ele correrá a “te alumiar”. “O Senhor te dará graça e glória”: a luz da sua graça aqui e a luz da sua glória quando receberes a coroa imarcescível. “Tua luz romperá como a aurora e tuas trevas serão como o meio-dia.” “Deus, que faz a luz brilhar em meio das trevas, luzirá em teu coração, para dar a conhecer a glória de Deus na face de Jesus Cristo.” “Neles o temor do Senhor fará levantar-se o Sol da Justiça, trazendo a salvação em suas asas.” Naquele dia a ti se te dirá: “Levanta-te, brilha; porque tua luz vem e a glória do Senhor se levanta sobre ti”. Porque Cristo revelar-se-á em ti: e ele é a verdadeira Luz.
2. Deus, que é luz, dar-se-á a si mesmo a todo pecador que desperte e por ele suspire: serás então um templo do Deus vivo; Cristo “habitará em teu coração pela fé”. “Arraigado e fundado no amor, estarás apto a compreender, com todos os santos, qual seja o comprimento, e largura, e profundidade: e altura do amor de Cristo, amor que excede a toda compreensão”.
3. Vede vossa vocação, irmãos. Somos chamados a ser “habitação de Deus mediante seu Espírito”; e, pelo seu Espírito habitamos em nós, tornamo-nos capazes de ser santos desde agora e participantes da herança dos santos em luz. Como são majestosamente vastas as promessas feitas a nós, e já no presente em nós cumpridas, em nós, os que cremos! Porque pela fé “recebemos, não o espírito do mundo, mas o Espírito de Deus”— a súmula de todas as promessas— “para que possais conhecer as coisas que vos são dadas livremente ppr Deus”.
4. O Espírito de Cristo é o grande dom que, em várias ocasiões e de diversas maneiras, Deus prometeu ao homem e efetivamente o tem comunicado, a partir do tempo da glorificação do mesmo Cristo. Essas promessas, feitas antes aos pais, Deus as cumpre deste modo: “Porei meu Espírito dentro de vós e vos farei andar em meus estatutos”. (Ez 26.27). “Derramarei água sobre o sedento e torrentes sobre o terreno árido: derramarei meu Espírito sobre tua semente e minha bênção sobre tua descendência”. (Is 44.3).
5. Todos vós podeis ser testemunhas vivas destas coisas —da remissão dos pecados e do dom do Espírito Santo: “Se podes crer, todas as coisas são possíveis ao que crê”. “Qual dentre vós é o que teme ao Senhor, e ainda anda em trevas e não tem luz”? Pergunto-te, em nome de Jesus: “Crês que seu braço não se retraiu de todo? Crês que ele ainda é poderoso para salvar, sendo o mesmo ontem, hoje e para sempre? Crês que ele tem poder, sobre a terra, de perdoar pecados”? “Filho, tem bom ânimo; teus pecados são-te perdoados”. Deus, por amor de Cristo, te perdoou. Recebe isto, “não como palavra humana; mas, certamente, como Palavra de Deus, o que na realidade é”, e serás justificado livremente mediante a fé; serás também santificado pela fé que há em Jesus, e sobre ti será aposto o selo divino, em testemunho de que “Deus nos deu a vida eterna, e que esta vida está em seu Filho”.
6. Irmãos, deixai que vos fale livremente e sofrei a palavra desta exortação, embora partindo de um dos últimos na hierarquia da Igreja. Vossa consciência vos testifica, no Santo Espírito, que essas coisas são assim, se é que já provastes que o Senhor é benigno. “Esta é a vida eterna: conhecer o único e verdadeiro Deus e a Jesus Cristo, a quem ele enviou”. Este conhecimento experimental, e só este conhecimento é o verdadeiro cristianismo. Quem recebeu o Espírito Santo é cristão; quem não o recebeu não é cristão. Não é possível recebê-lo e depois disto ainda não o conhecer. “Porque naquele dia (quando ele vier, diz o Senhor), conhecereis que estou em meu Pai, e vós em mim, e eu em vós”. Este é aquele “Espírito de Verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê, nem o conhece; mas vós o conheceis, porque habita em vós e estará em vós”. (Jo 14.17).
7. O mundo não pode recebê-lo, mas, ao revés, contendendo e blasfemando, absolutamente rejeita a Promessa do Pai. Mas todo espírito que o não confessa não é de Deus. Sim, “este é o espírito do Anticristo, acerca do qual tendes ouvido que virá ao mundo, e já agora está no mundo”. Quem quer que negue a inspiração do Espírito Santo, ou negue que a comunicação do Espírito de Deus seja o privilégio comum de todos os crentes, a bênção do Evangelho, o dom indizível, a promessa universal, o critério pelo qual se mede o real cristão, — é o Anticristo.
8. De nada lhes aproveita o dizer: “Não negamos a assistência do Espírito de Deus; mas apenas essa inspiração, arecepção do Espírito Santo de maneira sensível. É somente a sensação do Espírito, o ser movido pelo Espírito oucheio dele, que negamos ter qualquer fundamento em sólida religião”. Mas, somente com negardes isto, negais toda a Escritura, toda a verdade, toda a promessa e o testemunho de Deus.
9. Nossa querida Igreja nada conhece dessa distinção diabólica, mas, ao contrário, claramente, fala do“sentir o Espírito de Cristo” ; de ser alguém “movido pelo Espírito Santo” ; e conhecer e “sentir que não há outro nome senão o de Jesus,” , pelo qual possamos receber vida e Salvação. Ela a todos nos ensina a “pedir a inspiração do Espírito Santo” ; sim, para que possamos “encher-nos do Espírito Santo” . Além disto, ensina que todo presbítero eleito dentre seus membros “recebe o Espírito Santo pela imposição das mãos”, Assim, negar qualquer dessas verdades é, com efeito, renunciar à Igreja da Inglaterra e a toda Revelação cristã.
10. A “Sabedoria de Deus” sempre foi tida pelos homens como “loucura”. Nada de admirável há, portanto, no fato de o grande mistério do Evangelho estar agora “oculto aos sábios e entendidos”, exatamente como o estivera nos tempos antigos; nada de admirável que o Evangelho seja hoje quase universalmente negado, ridicularizado, desacreditado como simples delírio, sendo estigmatizados com os qualificativos de loucos e fanáticos todos os que ainda ousam confessá-lo. Esta é a “decadência” que deveria vir; a apostasia geral dos homens de todas as condições e categorias, que vemos agora avassalando a terra. “Percorre abaixo e acima as ruas de Jerusalém e vê se achas um homem”, um homem que ame ao Senhor seu Deus de todo seu coração e o sirva com todas as suas forças. Como nossa terra geme, (não olhemos para trás! Debaixo do transbordamento da iniqüidade! Quanta vilania de toda espécie se comete a cada passo e, o que mais é, com impunidade, por aqueles que pecam ostensivamente, gloriando-se de sua ignomínia! Quem pode contar os juramentos, as maldições, as profanações, as blasfêmias; a mentira, a calúnia, a maledicência; as quebras do domingo, a glutonaria, a bebedice, a vingança; a prostituição, os adultérios e várias impurezas; as fraudes, a injustiça, a opressão, a extorsão,
que cobrem nossa terra, submergindo-a como num dilúvio?
11. Mesmo entre os que se têm guardado isentos das abominações mais grosseiras, quanta ira e orgulho, quanta preguiça e egoísmo, quanta moleza e efeminação, quanta luxúria e indulgência, quanta cobiça e ambição, quanta sede de louvor, quanto amor ao mundo, quanto receio do homem não lhes jazem no intimo! Ao mesmo tempo, quão pouco há de verdadeira religião! Porque, onde está o que ama a Deus ou ao próximo, na medida do mandamento que nos deu o Senhor? De um lado estão os que nem chegam a ter a forma da piedade; de outro lado estão os que possuem apenas a forma: ali são os sepulcros abertos; aqui, os sepulcros branqueados. De modo que em qualquer ato, onde quer que se forme algum ajuntamento de povo (temo que o público de nossas igrejas não faça exceção!) facilmente se pode perceber que de uma parte estão os Saduceus e de outra os Fariseus: uns dando tão escassa importância à religião, como se não houvesse “ressurreição, nem anjos, nem espírito”; e os outros dela fazendo simplesforma de vida, um jogo estúpido de cerimônias externas, sem verdadeira fé, nem amor de Deus, nem gozo
no Espírito Santo!
12. Prouvera a Deus que nos excetuássemos, nós, os que nos encontramos neste lugar! “Irmãos, o desejo de meu coração e minha oração a Deus, em vosso beneficio, é que sejais salvos” dessa onda de impiedade, e que suas vagas orgulhosas se possam deter aqui. Entretanto, está, na verdade, acontecendo isto? Deus e nossa própria consciência sabem que esta não é a realidade: Não vos tendes guardado puros. Corruptos também o somos nós e abomináveis— e poucos são os que têm melhor entendimento, poucos os que adoram a Deus em espírito e em verdade. Também somos “uma geração que não aplica o coração retamente, e cujo espírito não se firma solidamente em Deus”. Deus nos qualificou como “o sal da terra”; mas, “se o sal perder seu sabor, para nada mais presta, senão para ser lançado fora e pisado pelos homens”.
13. E “não visitarei essas coisas, diz o Senhor? Minha alma não tomará vingança de uma nação como esta?” Sim, não sabemos quanto tempo falta para que Ele ordene à espada: “Espada, fere através desta terra!” Deus nos tem dado muito tempo para o arrependimento. Deixa-nos ele por este ano também, avisando-nos, todavia, e despertando-nos por meio do trovão. Seus juízos estão divulgados na terra — e temos toda razão de esperar o mais grave de todos, isto é, que “ele venha rapidamente a nós e remova nosso candeeiro de seu lugar, a não ser que nos arrependamos e façamos nossas primeiras obras”; a não ser que voltemos aos princípios da Reforma, à verdade e simplicidade do Evangelho. Talvez estejamos resistindo ao derradeiro esforço da graça divina para salvar-nos. Talvez estejamos quase a “encher a medida de nossas iniqüidades”, rejeitando o conselho de Deus contra nós mesmos e expulsando seus mensageiros.
14. Ó Deus, “em meio da ira, lembra-te de tuas misericórdias!”Sê glorificado em nossa emenda, e não em nossa perdição! Que “atendamos à correção e àquele que a inflige!” Agora que teus “juízos se acham divulgado-na terra”, que os habitantes do mundo “aprendam a justiça!”.
15. Meus irmãos é tempo de despertarmos do sono, antes que “soe a grande trombeta do Senhor” — e nossa terra se transforme em campo de sangue. Oh! Que vejamos rapidamente as coisas que nos possam assegurar a paz, antes que elas se ocultem a nossos olhos! “Volta-te para nós, ó bom Deus, e cesse tua ira. Ó Senhor, olha dos céus, considera e visita tua vinha”; e faze-nos conhecer “o tempo de nossa visitação”. “Ajuda-nos, ó Deus de nossa salvação, para glória de teu nome!” Oh! Liberta-nos, e sê misericordioso em face de nossos pecados, por amor de teu nome, e assim não nos afastaremos de ti. Faze-nos viver, e invocaremos o teu nome. Volta-te, Senhor Deus dos Exércitos! Mostra-nos a luz de tua face —e seremos sanados. "Agora, àquele que é capaz de fazer muito mais do que tudo quanto podemos pedir ou pensar, segundo o pode que opera em nós, a Ele seja a glória na igreja por Jesus Cristo, em todos os tempos até a consumação dos séculos. Amém!"

Advertência Contra o Sectarismo


ADVERTÊNCIA CONTRA O SECTARISMO
“Disse-lhe João: Mestre, vimos um homem que não nos segue, expelir demônios em teu nome e lho proibimos, porque não nos seguia. Mas Jesus respondeu: Não lho proibais.”
(Marcos 9.38, 39)
1. Lemos nos precedentes versículos que, após terem estado os doze em disputa sobre “qual deles seria o maior, Jesus, tomando um menino, disse-lhes: Aquele que receber um destes meninos em meu nome, a mim é que recebe; e aquele que me recebe, não me recebe a mim” somente, “mas Aquele que me enviou”. Então “João respondeu”, isto é, disse, em referência ao que nosso Senhor acabava de ensinar: “Mestre, vimos um homem que não nos segue, expelir demônios em teu nome, e lho proibimos, porque ele não nos seguia”. É como se ele houvesse dito: “Devíamos tê-lo recebido? Recebendo-o, teríamos recebido a ti? Não devíamos antes tê-lo impedido? Fizemos bem nisso?” “Mas Jesus disse: Não lho proibais.”
2. A mesma passagem é repetida por S. Lucas, quase nas mesmas palavras. Pode-se, porém, perguntar: “Que tem isso conosco, uma vez que no presente ninguém expulsa demônios? O poder de fazer isto não foi retirado à Igreja há doze ou catorze séculos? Como, então, nos interessa o caso aí recordado, ou a decisão de nosso Senhor no tocante a ele?”
3. Talvez mais de perto do que se imagina comumente, visto que o caso proposto não é invulgar. Para que possamos retirar dele toda vantagem, pretendo mostrar, primeiro, em que sentido os homens podem agora expelir demônios, e de fato os expelem; segundo, o que devemos entender pela expressão: “Ele não nos segue”. Explanarei, em terceiro lugar, o preceito de nosso Senhor: “Não lho proibais”, concluindo com uma inferência tirada do conjunto.

I

1. Quero mostrar, primeiro, em que sentido os homens podem agora expelir demônios, e de fato os expelem. Para que se tenha um conceito claro no tocante a este assunto, lembrarei que, (segundo o registro bíblico), como Deus vive e opera nos filhos da luz, o diabo vive e opera nos filhos das trevas. Como o Espírito Santo possui a alma dos bons, assim o espírito mau possui a alma dos ímpios. Daí lhe chamar o apóstolo “o deus deste mundo”, dado o poder soberano que tem sobre os homens do mundo. Daí resulta que nossobendito Senhor o designa como “o príncipe deste mundo”, tão absoluto é seu domínio sobre o mundo. E daí afirmar S. João: “Sabemos que somos de Deus e” todos os que não são de Deus, “todo o mundo” en tw ponhrw keitai, não - está posto na maldade, mas “está posto no maligno”; vive e move-se nele, como os que não são do mundo vivem e movem-se em Deus.
2. Porque o diabo não é para considerar-se apenas como “um leão rugindo em torno e procurando” a quem possa tragar”; não meramente como um inimigo sutil, que se lança de improviso sobre as pobres almas e”leva-as cativas à sua vontade”, mas como o que nelas habita e nelas anda, que governa as trevas ou a maldade deste mundo (dos homens do mundo e todos os seus tenebrosos desígnios e ações), tomando posse de seus corações, ali estabelecendo seu trono e reduzindo todo pensamento à sujeição. Assim, o “forte homem armado guarda sua casa”; e esse “espírito imundo” algumas vezes “sai do homem”, com freqüência volta com “sete espíritos piores do que ele próprio, e entram, e habitam ali”. Nem pode ele ficar ocioso em SUa habitação. Está continuamente “operando” nesses “filhos da desobediência”. Neles opera com poder, com poderosa energia, transformando-os à sua própria semelhança, apagando todos os vestígios restantes da imagem de Deus e preparando-os para toda palavra e obra má.
3. É pois, uma verdade inquestionável, que o deus e príncipe deste mundo ainda possui a todos que. não conhecem a Deus. Somente a maneira pela qual ele agora os possui difere do processo dos tempos antigos. Então, com freqüência lhes atormentava o corpo assim como a alma, e isto abertamente, sem qualquer disfarce; agora ele lhes atormenta apenas a alma (salvo raras exceções), e fá-lo tão veladamente quanto possível. É clara a razão de semelhante diferença: seu objetivo era então levar a humanidade à superstição; por isso operava tão abertamente quanto podia. Agora, porém, seu objetivo é induzir-nos à infidelidade; por isso age tão cautelosamente quanto pode: quanto mais disfarçado se apresente, mais avassalador se torna.
4. Se dermos crédito aos historiadores, há regiões, ainda agora, onde o diabo opera tão abertamente como nos velhos tempos. “Mas, por que isto se dá somente em terras selvagens e bárbaras? Por que não na Itália, na França, ou na Inglaterra?” Por uma razão muito simples: ele conhece seus homens e sabe o que tem a fazer com cada um deles. Aos lapõnios aparece desmascarado, porque seu objetivo é confirmá-los na superstição e na idolatria grosseira. Convosco seu propósito é diverso: deseja transformar-vos em vosso próprio í.dolo; fazer-vos mais sábios
a vossos próprios olhos do que o próprio Deus, do que todos os Oráculos de Deus. Ora, para conseguir isto, ele não deve aparecer em sua própria figura: tal conduta lhe frustraria os desígnios. Não: usa de toda sua arte para fazervos negar sua existência, até que vos apanhe despreocupados e a seu inteiro alcance.
5. Ele reina, pois, embora de modos diferentes, mas em caráter absoluto, tanto numa como noutra terra. Tem o alegre italiano incrédulo tão preso a seus dentes como O tártaro asselvajado. Mas ao que dorme profundamente na cova do leão, este é bastante prudente para o não despertar. Hoje o diabo somente brinca com o adormecido; quando lhe apraz, engole-o de uma vez.
O deus deste mundo colhe seus adora dores ingleses tão descuidados como os da Lapõnia. Mas não é de seu “interesse afligi-los, para que não aconteça que eles voem para o Deus do céu. O príncipe das trevas não aparece, conquanto reine sobre esses submissos filhos seus. O dominador concede a seus cativos a maior segurança, porque eles acreditam estar em liberdade. Assim, “o forte homem armado guarda sua casa, e seus bens estão seguros”; nem o teista, nem o cristão nominal suspeita de sua presença ali: deste modo, o dominador e os cativos vivem entre si na melhor harmonia.
6. Durante todo esse tempo o diabo opera nos possessos com energia. Cega-lhes os olhos do entendimento, de modo que a luz do glorioso Evangelho de Cristo não possa brilhar sobre eles. Acorrenta-lhes a alma à terra e ao inferno, com. cadeias forjadas pelas suas próprias afeições vis. Prende-os à terra pelo amor ao mundo, pelo amor ao dinheiro, ao prazer, à lisonja. E por orgulho, inveja, ira, ódio, vingança, leva sua alma à borda do inferno, agindo mais segura e impunemente, porque os homens não sabem que o diabo esteja agindo.
7. Quão facilmente podemos conhecer a causa por seus efeitos! Estes algumas vezes são grosseiros e palpáveis. Assim são eles nas mais”brilhantes nações pagãs. Não é necessário ir mais longe do que aos admirados, virtuosos romanos: acha-los-eis, quando no pináculo de sua erudição e de sua glória, “cheios de toda a injustiça, malícia, avareza e maldade; cheios de inveja, homicídio, contenda, dolo e malignidade; detratores, difamadores, aborrecíveis a Deus, insolentes, soberbos, presunçosos, inventores de males, desobedientes aos pais, insensatos, pérfidos, sem afeição natural e sem misericórdia”.
8. As partes mais fortes desta descrição são confirmadas por alguém que alguns julgam ser a testemunha mais insuspeita. Quero referir-me a seu irmão de paganismo, Dion Cassius, o qual observa que, antes que César voltasse da Gália, não só a glutonaria e a devassidão de toda espécie se praticavam aberta e escancaradamente; não só a falsidade, a injustiça e a crueldade dominavam tanto nos tribunais como no seio das famílias; mas os latrocínios mais ultrajantes, a rapinagem e os homicídios eram tão freqüentes em todos os recantos de Roma, que poucos homens saíam de casa sem fazer as disposições de última vontade, não sabendo se voltariam vivos!
9. Igualmente grosseiras e palpáveis são as obras do diabo entre muitos (senão na totalidade), dos pagãos
modernos. A religião natural dos Creeks, Cherokees, Chickasaws e todos os outros índios que vagueiam pelos nossos territórios do sul, (não uns poucos homens, mas nações inteiras), é esta: torturam todos os seus prisioneiros, da manhã à noite, queimando-os afinal até que morram; e à mais leve ofensa involuntária, vêm pelas costas e atiram no próprio companheiro! Sim, é comum entre eles fazer o filho saltar os miolos ao próprio pai, se julga que este vive demasiadamente; e, quanto às mães, se estão enfadadas com os filhos, atam-lhes pedras ao pescoço e lançam-nos, três ou quatro deles, ao rio, um após outro!
10. Seria desejável que ninguém, exceto os pagãos, praticasse tais obras grosseiras, palpáveis, do diabo. Mas não ousamos dizê-la. Mesmo em crueldade e derramamento de sangue, quão pouco estão os cristãos aquém daqueles! Não foram só os espanhóis ou portugueses, massacrando milhares na América do Sul; não só os holandeses, nas Índias Orientais, ou os franceses na América do Norte, seguindo passo a passo os espanhóis: também nossos compatriotas têm brincado com o sangue, exterminando nações inteiras, com isto provando eloqüentemente qual o espírito que habita e opera nos filhos da desobediência.
11. Aqueles monstros quase nos fariam fechar Os olhos às obras do diabo que se praticam em nosso país. Mas, ai! não podemos abrir os olhos mesmo aqui, sem que as vejamos por todos os lados. Será pequena prova de seu poder o fato de os perjuros contumazes, ébrios, devassos, adúlteros, ladrões, salteadores, sodomitas, assassinos, serem ainda achados por todos os recantos de nossa terra? Como deve o príncipe deste mundo reinar triunfalmente sobre todos esses filhos da desobediência!
12. Menos abertamente, mas não menos eficientemente, o diabo opera nos dissimulados, maledicentes, mentirosos, difamadores; nos opressores e concussionários; nos perjuros, vendedores de seus amigos, de sua honra, de sua consciência, de sua pátria. E esses ainda falam de religião e consciência; de honra, virtude e espírito público! Mas não podem enganar mais a Satanás do que a Deus. Aquele do mesmo modo conhece os que são seus: e ele tem, hoje, sobre uma grande multidão, recrutada de todas as nações e povos, pleno domínio.
13. Se considerardes isto, não podeis deixar de ver em que sentido os homens podem ainda agora expelir
demônios: e todo ministro de Cristo os expele, se em suas mãos prospera a obra do Senhor. Pelo poder de Deus a cuidar de sua obra, o ministro traz os pecadores ao arrependimento: inteira mudança se opera, tanto no seu interior como no exterior, pensando de todo o mal para todo. o bem. E isto é, em sentido profundo, expelir os demônios das almas em que eles tinham até então habitado. O forte não pode por mais tempo guardar sua casa. Um mais forte caiu sobre ele e o expulsou, e dela tomou posse para si mesmo, e dela fez uma habitação de Deus pelo Espírito. Aí, pois, termina o poder de Satanás e o Filho de Deus “destrói as obras do diabo”. O entendimento do pecador -agora se ilumina e seu coração docemente pende para Deus. Seus desejos se apuram, suas afeições se purificam e, cheio do Espírito Santo, cresce em graça, até ser não apenas santo no coração, mas em toda maneira de conversação.
14. Tudo isso é, na verdade, obra de Deus. Só Deus pode expelir Satanás. Mas geralmente é de seu agrado fazer isso por meio do homem, como instrumento em suas mãos, o qual diz então expelir os demônios em seu nome, por seu poder e autoridade. E Ele envia a quem queira enviar para essa grande obra, mas usualmente do modo por que o homem Jamais havia pensando, porque “seus caminhos não são como os nossos caminhos, nem seus pensamentos como os “nossos pensamentos”. Escolhe, portanto, o fraco para confundir o forte; o insensato para confundir o sábio, pela simples razão de poder reservar a glória para si mesmo, para que “nenhuma carne se glorie em sua presença”.

II

1. Mas podemos nós impedir a alguém que assim “expulsa os demônios”, se “ele não nos segue”? Esse era, parece, tanto o juízo como a prática do apóstolo, até que este referiu o caso a seu Senhor. “Nós lho proibimos”, disse ele, “porque não nos segue”, o que supunha ser razão suficiente. Que devemos enten-der pela expressão: “Ele não nos segue”? Este é o ponto que consideraremos a seguir. A circunstância mais radical que podemos admitir à vista daquela expressão, é que - ele não tem ligação conosco. Não trabalhamos lado a lado. Ele não é nosso cooperador no Evangelho. E, na verdade, desde que seja do agrado de nosso Senhor enviar muitos trabalhadores para a sua seara, nem todos podem agir na dependência uns dos outros, ou entre si relacionados. Nem podem todos eles ter relações pessoais entre si, nem tão pouco se conhecer uns aos outros. Muitos estarão necessariamente em partes diversas da seara, tão fora das Possibilidades de se relacionarem, que uns aos outros serão tão estranhos como se houvessem existido em diferentes eras. E em referência a qualquer daqueles a quem não conhecemos, podemos
dizer sem dúvida alguma: “Ele não nos segue”.
2. O segundo significado dessa expressão pode ser: Ele não é de nosso partido. Tem sido por muito tempo objeto de triste consideração, por parte de todo o que ora pela paz de Jerusalém, o fato de tantos partidos ainda subsistirem entre os que são chamados cristãos. Isso tem sido particularmente observado entre nossos próprios conterrâneos, que se têm constantemente separado uns dos outros em pontos destituídos de importância e, muitas vezes, em pontos que nenhuma relação têm com a religião. As circunstâncias mais banais têm dado lugar a diferentes partidos, que continuam por muitas gerações - e cada partidário estará pronto a dizer acerca de outro que pertença ao lado oposto: “Ele não nos segue”.
3. Aquela expressão pode vir a ser, em terceiro lugar: Ele difere de nós nas opiniões religiosas. Tempo houve em que os cristãos possuíam uma só mente e um só coração - tão grande graça repousava sobre todos eles, quando foram inicialmente cheios do Espírito Santo! Quão pouco durou, entretanto, essa bênção! Como se quebrou depressa aquela unanimidade! E diferenças de opinião brotaram de novo, mesmo no seio da Igreja de Cristo, e isto se deu não apenas em relação a cristãos nominais, mas em se tratando mesmo de reais cristãos; sim, e dos principais dentre eles - os próprios apóstolos! Nem parece que a divergência que primeiro se levantou fosse jamais conciliada inteiramente. Não verificamos que mesmo as colunas do templo de Deus, enquanto permaneceram sobre a terra, fossem levados a ter o mesmo pensamento, a ter uma só mente, com especialidade acerca da lei cerimonial. Não há, pois, lugar para admirar-se de que infinitas variedades de opinião agora se encontrem na Igreja cristã. Uma conseqüência mui possível disso é que, ao vermos certo homem “expelindo demônios”, seja o tal
alguém que, nesse sentido, “não nos segue”, isto é, não é de nossa opinião. É difícil imaginar que ele tenha a nossa mentalidade em todos os pontos, mesmo em religião. Mui provavelmente deve ele pensar de modo, diferente, mesmo em vários assuntos de importância, como da natureza e utilidade da lei moral, dos eternos decretos de Deus, da suficiência e eficácia de sua graça e da perseverança de seus filhos.
4. Ele pode diferir de nós, em quarto lugar, não só em opinião, mas igualmente em algum ponto de prática. Pode não aprovar a maneira de prestar culto a Deus observada em nossa congregação; e pode julgar ser mais proveitoso à sua alma a forma que decorre de Calvino ou de Martinho Lutera. Pode ter muitas objeções à liturgia que colocamos acima de todas as outras; pode ter muitas dúvidas no tocante à forma de governo de igreja que julgamos ser apostólica e bíblica. . Talvez possa ele separar-se ainda mais de nós: pode, por um princípio de consciência, abster-se de várias das ordenanças que acreditamos serem ordenanças de Cristo. Ou, se ambos concordamos em que elas sejam dispostas por Deus, pode ainda permanecer alguma diferença entre nós, seja nó modo de administrar aquelas ordenanças, seja no tocante às pessoas a quem devam ser ministradas. Ora, a inevitável conseqüência de qualquer dessas diferenças será que, o que assim difere de nós, de nós se separe, em razão daqueles pontos, apartando-se de nossa sociedade. Neste sentido, portanto, ,”ele não nos segue”: não é, (como nos expressamos), “de nossa igreja”.
5. Num sentido muito mais forte, “não nos segue” aquele que, não somente é de uma igreja diferente, mas de uma igreja que acreditamos ser, a muitos respeitos, antibíblica e anticristã; uma igreja que acreditamos ser tão profundamente falsa e errada em sua doutrina, como perigosamente errada em sua prática; culpada de superstição grosseira e idolatria; uma igreja que adicionou muitos artigos à fé que foi uma vez entregue aos santos que Suprimiu todo um mandamento de Deus e invalidou vários dentre os restantes, por causa de suas tradições; e que, pretendendo professar a mais elevada veneração à igreja antiga, e a mais estrita conformidade com esta, recaiu, todavia, em enumeráveis inovações, sem qualquer apoio da antigüidade ou da Escritura. Ora, mui certamente “não nos segue” o que fica a tão grande distância de nós.
6. E pode haver diferenças ainda maiores do que essas. O que difere de nós em opinião ou em prática, pode possivelmente estar a maior distância de nós em afeição do que em conceito doutrinário. Este é, na verdade, um efeito mui natural e mui comum. A diferença que começa em pontos de opinião raramente termina aí. As diferenças geralmente se infiltram nas afeições e separam então os grandes amigos. Nem há animosidades tão profundas e irreconciliáveis como as que procedem da discordância em religião. Por esta causa os mais encarniçados inimigos do homem são os de Sua própria casa. Por essa causa o pai se levanta contra seus próprios filhos e os filhos contra seu pai; e talvez uns aos outros se persigam até a morte, pensando que, procedendo assim, estão prestando serviço a Deus. Nada há, portanto, que exceda ao que poderíamos esperar, se os que diferem de nós, seja em opiniões religiosas, seja em prática, logo se tornem acerbos e amargos; tornem-se cada vez mais prevenidos, formando mau juízo tanto de nossa pessoa como de nossos princípios. Uma conseqüência quase necessária disso será que falem assim como pensam. Colocar-se-ão em oposição a nós e. na medida de suas capacidades, embaraçarão nosso trabalho, visto que lhes não parece ser esse trabalho uma obra de Deus, mas do homem ou do diabo. O que pensa, fala ou age de modo tal como esse, no mais alto sentido - “não nos segue”.
7. Não concebo, entretanto, que a pessoa de quem o apóstolo fala no texto (embora não tenhamos detalhes
particulares sobre ela, nem no contexto, nem em qualquer outra parte dos Sagrados Escritos), tenha chegado a tal ponto. Não temos funda-mento para supor que houvesse qualquer diferença material entre ela e os apóstolos; muito menos que nutrisse qualquer preconceito” contra eles ou contra seu Mestre. Parece que podemos inferir muita coisa das palavras de nosso Senhor que se seguem imediatamente ao texto: “Ninguém há que faça milagre em meu nome e possa dizer mal de mim”. Mui de propósito coloco o caso em luz mais forte, aduzindo todas as circunstâncias que bem possam ser concebidas, para que, prevenidos contra a tentação em sua maior força, em caso algum cedamos” a ela, combatendo contra Deus.

III

1. Suponha-se, então, que certo homem não tenha relação conosco; suponha-se que não seja de nosso partido; suponha-se esteja separado de nossa igreja, sim, e diferindo largamente de nós, tanto em conceito, como em prática e sentimento. Ainda assim, se virmos esse homem “expelindo demônios”, Jesus diz: “Não lho proibais”. Tenciono explanar, em terceiro lugar, este importante conselho de nosso Senhor.
2. Se virmos esse homem expulsando demônios. Mas, bom será se, mesmo neste caso, crermos no que vemos com nossos próprios olhos, se não desmentirmos nossos próprios sentidos. Seria escassamente consentâneo com a natureza humana o que imediatamente não percebesse quão extremamente indispostos somos para crer que algum homem que “não nos segue”, em todos ou na maior parte dos sentidos acima referidos, possa expelir demônios. Quase teria dito – em cada um desses sentidos, uma vez que aprendemos claramente do que se” passa em nosso próprio coração quanto repugna aos homens reconhecer qualquer mérito nos que com eles não concordam em todos os pontos.
3. “Mas, qual é a prova suficiente, razoável, de que o homem (no sentido acima) expulse demônios?” :m fácil a resposta. Há prova cabal (1) de que a pessoa que temos diante de nós era um rude, ostensivo pecador? (2) Ela não é mais assim? Rompeu com seus pecados e vive agora uma vida cristã? E, (3) Essa mudança se operou, ouvindo aquele homem pregar? Se estes três pontos são claros e inegáveis, então tendes prova suficiente e racional, tal que não podeis recusar sem pecado voluntário, de que aquele homem expulsa demônios.
4. Então, “não lho proibais”. Guardai-vos de o embaraçar, seja pelo uso “de vossa autoridade, seja por argumentos ou persuasão. Não tenteis por modo algum impedir que ele use de todo o poder que Deus lhe concedeu. Se tendes autoridade sobre ele, não useis de semelhantes prerrogativas para entravar a obra de Deus. Não o enchais de razões pelas quais não deva mais falar no nome de Jesus. Satanás não deixará de enchê-lo de tais razões, mesmo que o não secundeis nessa obra. Não o convençais a separar-se de seu trabalho. Se ele der lugar ao diabo e a vós, muitas almas poderão perecer em sua iniqüidade; mas seu sangue Deus o requererá de vossas mãos.
5. Mas, se o que expulsa demônios forapenas um leigo! não devo, então, proibir-lhe?” O fato foi comprovado? Há prova concludente de que esse homem expulsou ou expulsa demônios? Se há, “não lho proíbas”“, não, para que tua alma não corra perigo. Não pode Deus operar por meio de quem quer que seja de sua vontade operar? Ninguém pode fazer essas obras a não ser que Deus esteja com ele, a não ser que Deus o tenha enviado exatamente para isso. Mas, se Deus o enviou, queres tu chamá-lo para trás? Queres proibir-lhe de ir?
6. “Não sei, entretanto, se ele foi enviado por Deus”. “Agora, nisto há uma coisa maravilhosa” (pode dizer um dos selos de seu apostolado, alguém que tenha sido arrebatado do domínio de Satanás para o de Deus), O que não saibas de onde é esse homem, e eis que ele me abriu os olhos! Se esse homem não tosse de Deus, nada  poderia fazer”. Se duvidas do fato, manda chamar seus pais: manda chamar seus irmãos, amigos, conhecidos. Mas, se não podes duvidar disto”, precisas reconhecer O que um milagre notável se operou; então, com que consciência, com que cara podes impor ao que Deus enviou que “não fale mais em seu nome”?
7. Concordo em que seja altamente aconselhável que, quem quer que pregue em nome de Cristo, tenha tanto a vocação interna como a vocação externa; mas, que esta seja absolutamente necessária, eu o negou demais, a Escritura não é terminante? Ninguém tome esta honra para si mesmo,  mas que seja chamado por Deus, como foi Aarão” (Hb 5.4). Por vezes incontáveis este texto se tem citado a este propósito, como encerrando a própria força do argumento; mas, seguramente, não houve jamais citação mais infeliz. Porque, primeiro, Aarão não foi de modo nenhum chamado para pregar: foi chamado para “oferecer dons e sacrifícios pelo pecado”. ESte era seu oficio particular. Em segundo lugar, aqueles homens não oferecem sacrifício algum, mas somente pregam” o que. Aarão não fez. Por isso, não é possível que se encontre em toda a Bíblia texto mais vazio de préstimo, para o caso em debate, do que esse.
8. “Mas, qual era a prática da era apostólica?” Podeis facilmente ver qual fosse ela nos Atos dos Apóstolos. No capitulo oito lemos: “Naquele dia levantou-se uma grande perseguição contra a igreja em Jerusalém e todos, exceto os apóstolos, foram dispersas pelas regiões da Judéia e Samaria.” (versículo 1) “Os que, porém, haviam sido dispersos, iam por toda a parte pregando a Palavra.” (versículo 4) Ora, foram todos esses exteriormente chamados a pregar? Homem algum, no gozo de suas faculdades mentais, pode pensar assim. Ai está, portanto, uma prova irrecusável de qual fosse a prática na era apostólica. Vemos ai” não um, mas uma multidão de pregadores leigos, homens que somente foram enviados por Deus.
9. Na verdade, tão longe está a prática da era apostólica de inclinar-nos a pensar fosse ilegal que o homem
pregasse antes de ser ordenado, que temos razões de pensar que isso era então Julgado necessário. Certamente que a prática e o conselho do apóstolo Paulo eram no sentido de provar o homem antes que fosse ordenado. “Aqueles” (os diáconos) “sejam primeiro provados; depois exerçam o oficio de diácono” (1Tm 3.10). Provados de que modo? Exigindo-se que compusessem uma sentença em grego e respondessem a umas tantas perguntas triviais? Oh! Admirável prova de um ministro de Deus! Não; mas fazendo “uma clara, aberta experiência (como ainda se faz na maior parte das igrejas protestantes da Europa), não somente de sua vida santa e irrepreensível, mas acerca da posse de certos dons que são absoluta e indispensavelmente necessários à edificação da Igreja de Cristo.
10. Que se há de fazer, todavia, se o homem possui esses dons, tem trazido pecadores ao arrependimento, e, ainda assim o bispo não quer ordená-lo? Então o bispo proíbe-lhe de expelir demônios. Mas eu não cuido de lho proibir: minhas razões eu as publiquei no mundo todo. Se ainda se insiste, devo publicá-la de novo. Tu que insistes nesse ponto, responde àquelas razões. Não sei de alguém que ainda o tenha feito ou tentado fazê-la. Somente alguns têm falado dessas razões como fracas e fúteis – e isto era de notável prudência, porque é mais fácil desprezar um argumento, ou afetar desprezá-la, do que dar-lhe resposta. Até que isto se faça, devo dizer: quando tenho prova convincente de que qualquer homem expele demônios, seja o que for que os outros façam, não penso em proibirlho, para que não seja encontrado a combater contra Deus.
11. Quem quer que sejas que temes a Deus, “não lho proibas”, nem direta, nem indiretamente. Muitos meios há de o fazer. Indiretamente lho proibas, se negas abertamente, ou desprezas, ou tratas com descaso a obra que Deus opera por suas mãos. Indiretamente lho proíbes, quando o desanimas em sua obra, enredando-o em disputas no tocante a esse trabalho, levantando objeções contra ele, ou atemorizando-o com conseqüências que mui possivelmente jamais se verificarão. Tu lho proíbes quando demonstras qualquer malquerença para com ele, seja em palavras ou em atitudes; e muito mais quando a ele te referes, conversando, de modo desagradável e desprezível; quando intentas representá-lo de forma odiosa ou depreciativa. Tu lho proíbes quando dele dizes mal ou não dás apreço a seus labores. Oh! Não lho proíbas por qualquer desses processos, nem proíbas aos outros de o ouvirem - desviando os pecadores” da audição da Palavra que é apta para lhes salvar as almas!
12. Sim, se queres observar o preceito de nosso Senhor em sua plena significação, em todo seu alcance, lembra-te de sua palavra: “O que não é por nós é contra nós; e aquele que não se ajunta comigo, desgarra-se”: aquele que não congrega os homens no reino dos céus, certamente que os afasta desse reino. Não pode haver neutralidade nessa guerra. Cada um estará do lado de Deus ou do lado de Satanás. Estás do lado de Deus? Então, não só não proibirás a qualquer homem de expulsar demônios, mas tu mesmo trabalharás com o máximo de tuas energias por secundálo na obra. Prontamente reconhecerás a obra de Deus e proclamarás sua magnitude. Removerás de seu caminho, tanto quanto puderes, todas as dificuldades e objeções. Fortalecerás suas mãos, dele falando de modo honroso em face dos homens e divulgando as coisas que viste e ouviste. Encorajarás aos que acorrem à sua palavra, para que
ouçam ao que Deus enviou. Não omitirás nenhuma prova de terno amor, em nenhuma ocasião que Deus te abra para demonstrar-lha

IV

1. Se voluntariamente falharmos em algum desses pontos; se direta ou indiretamente lho proibirmos porque “ele não nos segue”, então somos sectários. Esta é a inferência que tiro do que foi exposto. Temo, porém, que ° termo “sectarismo”, usado tão freqüentemente como é, seja quase tão pouco entendido como a palavra “entusiasmo”. Sectarismo é o demasiado apego, o zelo excessivo no tocante ao nosso partido, opinião, igreja e religião. Assim, é sectário o que tão loucamente se aferra a qualquer daquelas coisas, tão fortemente se acorrenta a elas, que proíbe aos que expelem demônios, simplesmente porque diferem em qualquer daquelas particularidades.
2. Guarda-te disto. Toma cuidado, (1) em não te convenceres de sectarismo, pela tua Indisposição em crer que algum homem expulsa demônios, embora discorde de ti. Se estás livre disto e se reconheces o fato, então examinate a ti mesmo: (2) Não estou incurso em sectarismo n.este ponto, proibindo-lhe direta ou indiretamente? Não lho proíbo diretamente, neste assunto, porque ele não é de meu partido? Porque suas opiniões não coincidem com as minhas? Ou parque ele não presta culto a Deus de acordo com a liturgia religiosa que recebi de meus pais? 3. Examina-te a ti mesmo: não lho proíbo, pelo menos indiretamente, por qualquer daqueles motivos? Não me sinto desapontado pelo fato de Deus assim abençoar a um homem, dele se utilizando, embora sustente opiniões tão errôneas? Não o desanimo, porque não é de minha igreja, com ele discutindo acerca desta circunstância, levantando objeções e impressionando-lhe o espírito à. custa de conseqüências distantes? Não demonstro rancor, ciúme, indisposição de qualquer espécie, quer em minhas palavras, quer em minhas atitudes? Não menciono em sua ausência suas faltas (reais ou imaginárias), seus defeitos Ou fraquezas? Não impeço os pecadores de ouvir sua palavra? Se fazes qualquer dessas  coisas, és no presente um sectário.
4. “Busca-me, ó Senhor, e prova-me. Experimenta meus rins e meu coração! Vê bem ,se não há qualquer caminho” de sectarismo “em mim, e leva-me pelas veredas eternas”. Para que nos examinemos mais profundamente, proponhamos a questão de modo mais incisivo: que faria, se eu visse um papista, um ariano, ou sociniano, expelindo demônios? Se o visse, não poderia proibir ao que o fizesse, sob pena de me achar incurso em sectarismo. Ainda mais: se eu pudesse imaginar que me fosse dado ver um judeu, um teísta ou um muçulmano fazendo a. mesma coisa, se eu lho proibisse direta ou indiretamente, ainda não seria mais do que um sectário.
5. Oh! Permanece firme neste ponto! Não te contentes em não proibir a qualquer que expulse demônios. É bom que chegues até este ponto, mas não te detenhas aí. Se queres evitar todo sectarismo, vai além: Em cada exemplo dessa espécie, qualquer que seja o instrumento, reconhece o dedo de Deus, E não somente reconhece-o, mas regozijai-te em sua obra e louva seu nome com ações de graças. Anima a quem quer que seja que Deus se compraza em empregar, para que ele se entregue totalmente à tarefa. Onde quer que estiveres, fala bem desse homem; defende seu caráter e sua missão. Alarga, tanto quanto possas, seu campo de ação; mostra-lhe todo agrado em palavras e em obras; e não te canses de rogar a Deus em seu favor, para que o Senhor salve tanto a ele próprio como a seus ouvintes.
6. Não tenho necessidade de acrescentar senão uma só recomendação: não penses que o sectarismo dos outros seja desculpa para o teu. Não é impossível que alguém, que expulse demônios, pretenda proibir-te de também o fazeres. Observa que este é justamente o caso mencionado no texto. Os apóstolos proibiram a outrem de fazer o que eles faziam. Guarda-te, porém, da retribuição. Não é teu papel retribuir o mal com o mal. A não observância da parte dos outros, do preceito de nosso Senhor, não é razão para que o negligencies. Não; mas que o outro guarde para si todo o sectarismo. Se ele te proibir, não lho proíbas. Antes trabalha, vigia e ora ainda mais para lhe confirmar teu amor. Se ele fala toda sorte de mal contra ti, dize toda sorte de bem (que seja verdadeiro), a seu respeito. Imita neste ponto o dito glorioso de um grande homem (oh! tivesse ele sempre tido o mesmo espírito!): “Que Lutero mechame de cem demônios! Ainda assim o reverencio no caráter de mensageiro de Deus !”

Pensamentos inconstantes


PENSAMENTOS INCONSTANTES
“Levando a cativeiro todo o pensamento para a obediência a Cristo.”
(2 Coríntios 10.5)
1. TRARÁ Deus “todo pensamento a cativeiro para a obediência a Cristo”, de modo que nenhum pensamento inconstante caiba em nossa mente, mesmo enquanto permanecemos no corpo? Alguns o têm sustentado com veemência, afirmando mesmo que ninguém será aperfeiçoado em amor, a não ser que em medida igual seja aperfeiçoado no entendimento, de tal forma que todos os pensamentos inconstantes se dissipem;, a não ser que, não apenas toda afeição e toda tendência sejam santas, justas e boas, mas todo pensamento individual que se esboce na mente seja ponderado e sensato.
2. Esta é uma questão de não pequena importância. Porque, quantos dentre os que temem a Deus, e que o  amam, talvez de todo seu coração, não se têm afligido por essa causa? Quantos, por não a compreenderem retamente, têm sido não só afligidos, mas ainda grandemente prejudicados em sua alma, apurando-se a raciocínios inúteis, nocivos; retardando sua aproximação de Deus e fraquejando no correr a carreira que lhes estava proposta? Muitos, ainda, pela incompreensão do assunto, afastam o precioso dom de Deus, sendo induzidos, primeiro, a duvidar, e, depois, a negar a obra que Deus tem operado em suas almas; e dai ofenderem o Espírito de Deus, até que este se retire e deixe-os nas trevas mais profundas!
3. Como é que, em meio da abundância de livros que ultimamente se têm publicado sobre quase todos os assuntos, nada “temos, entretanto, sobre os pensamentos inconstantes? Pelo menos nenhum há que satisfaça a um espírito calmo e refletido para de algum modo preencher tal lacuna, tomo o encargo de inquirir:
I. Quais são as várias espécies de pensamentos inconstantes?
II. Quais são as causas gerais desses pensamentos?
III. Quais os que são pecaminosos e quais os que o não são?
IV. Quais são os de que podemos esperar libertação e podemos orar para o conseguir?

I

1. Proponho-me investigar, primeiro, quais são as diversas espécies de pensamentos inconstantes: As espécies particulares são inumeráveis; mas, em geral, eles são de duas espécies: pensamentos que se desviam de Deus e pensamentos que se desviam do ponto especial que tenhamos sob os olhos.
2. Em relação aos primeiros; todos “Os nossos pensamentos são naturalmente dessa espécie, porque eles “estão continuamente desviando-nos de Deus: nada pensamos acerca de Deus; Ele não está em todos os nossos pensamentos; estamos, todos e cada um, como observa o apóstolo, “sem Deus no mundo”. Pensamos naquilo que amamos, mas não amamos a Deus. Por isso não pensamos nele. Ou, se uma ou outra vez, somos constrangidos a pensar nele por algum tempo, como não temos, entretanto, prazer nisso e, demais, como aqueles pensamentos nos são não só insípidos, mas desagradáveis e enfadonhos, deles nos desviamos tão depressa quanto podemos, e voltamos ao que amamos para nisto Pensar. Assim é que o mundo e as coisas do mundo; que chamamos comer, que chamamos beber, que chamamos vestir, que podemos ver, que podemos ouvir, que podemos ganhar; com que podemos deleitar — nossos sentidos ou nossa imaginação— monopolizam todo nosso tempo e absorvem todos, os Pensamentos.  Enquanto, pois, amamos o mundo, isto é, enquanto permanecemos em nosso estado natural, todos os nossos pensamentos, da manhã à noite e da noite ao amanhecer, não são outra coisa se não pensamentos inconstantes.
3. Multas vezes, porém, estamos não somente “sem Deus no mundo”, mas também lutando contra Ele. Como em todo, homem, há, por natureza, a “mente carnal”, que é inimizade contra, Deus”, nada de admirável existe, portanto, no fato de os homens se excederem em pensamentos de incredulidade, já dizendo em seu coração: “Não há Deus”, já discutindo, “senão negando; seu poder ou sua sabedoria, sua misericórdia, ou justiça, ou Santidade. Nada há que admirar se eles tão freqüentemente duvidam de sua providência ou, pelo menos, da extensão dessa providência a todos os eventos; ou que, embora a reconheçam, ainda entretêm pensamentos de queixa ou de descontentamento. Relacionando-se muito de perto com tal atitude e a ela se associando com freqüência, surgem as imaginações orgulhosas e vãs. Mais: algumas vezes eles são tomados de pensamentos de ira, malícia ou vingança; outras vezes, de cenas imaginárias de prazer, seja sensual ou mental; graças a esses pensamentos, a mente terrena, sensual, se toma ainda mais terrena e sensual. Por tudo isso movem surda campanha contra Deus: são pensamentos
Inconstantes  da pior espécie.
4. Amplamente diferentes desta são as outras espécies de pensamentos inconstantes, nos quais o coração não se desvia de Deus, mas. o entendimento se desgarra do ponto particular a que se devia ater. Por exemplo: ponho-me a considerar às palavras do versículo que precede ao texto: “as armas de nossa milícia não são carnais, mas poderosas em Deus”. Penso: este deve ser o caso em relação a todos os que são chamados cristãos. Como, entretanto, as coisas se param de modo diverso! Olhai em tomo para quase todas as partes. do que se chama o mundo cristão.Que espécie de armas estão os crentes usando? Em que espécie de guerra se acham empenhados - “Enquanto os homens, quais demônios, urus aos outros se despedaçam, Em toda a raiva Infernal da guerra”? Vede como esses cristãos se amam uns aos outros! Neste ponto são eles preferíveis aos sarracenos ou pagãos? Que abominação se poderia encontrar entre os muçulmanos ou pagãos, que se não encontrem também entre os cristãos? E assim a mente se me desgarra, antes que eu o perceba, de uma para outra circunstância. Ora, tudo isso constitui, em algum sentido, inconstância de pensamento, porque, embora este não se desvie de Deus, e muito menos lute contra Ele, todavia se afasta do ponto particular em que eu tinha em vista fixá-la.

II

Assim como é a natureza, assim (para falar a linguagem corrente, em vez da linguagem filosófica), serão as várias espécies de pensamentos inconstantes. Mas, quais são as causas gerais desses pensamentos? Isto passaremos, em segundo lugar, a expor.
1. É fácil observar que as causas da primeira espécie de pensamentos-os que se opõem a Deus ou dele se desviam-são, em geral, as tendências pecaminosas. Por exemplo: por que Deus não está em todos os
pensamentos e em cada pensamento do homem natural? Por uma simples razão: seja ele rico ou pobre, letrado ou inculto, é um ateu; (embora não vulgarmente assim chamado); ele nem conhece, nem ama a Deus. Por que seus pensamentos estão continuamente correndo em pós do mundo? Porque é um idólatra. Na verdade não adora imagens, nem se encurva ante um tronco de árvore; entretanto, incorre em idolatria igualmente condenável: ama, isto é, rende culto ao mundo. Busca a felicidade nas coisas que se vêem, nos prazeres que perecem pelo uso. Por que perpetuamente estão seus pensamentos desgarrando-se da própria finalidade de seu ser— o conhecimento de Deus em Cristo? Porque é um incrédulo; porque não tem fé, ou, pelo menos, não tem mais fé do que o demônio. Assim, todos esses pensamentos inconstantes fácil e naturalmente resultam de uma perversa raiz de incredulidade.
2. O caso é o mesmo à luz de outros exemplos: o orgulho, a ira, a vingança, a vaidade, a cobiça, a ambição, cada um destes males ocasiona pensamentos consentâneos com sua própria natureza E assim acontece em relação a toda tendência de que. a mente humana é capaz. As particularidades são difíceis de enumerar—e nem isto é necessário que se faça: basta observar que, tantas tendências más encontram abrigo em toda alma faça: basta observar que, tantas tendências más encontram abrigo em toda alma quantos, são os caminhos pelos quais a alma se afasta de Deus pela pior espécie de pensamentos inconstantes
3. As causas da primeira espécie de Pensamentos inconstantes são extraordinariamente numerosas: “grande parte deles são ocasionados pe1a natural união da alma com o corpo. Quão imediata e profundamente é o entendimento afetado por uma doença do corpo! Basta que o sangue irrigue irregularmente o cérebro para que termine todo pensamento normal. Segue —se loucura furiosa; e então adeus, pensamento sereno! Sim, basta que a alegria se inflame ou se agite em certo grau, para que a loucura transitória, o delírio, impeça: todo pensamento refletido. E, a mesma irregularidade de pensamento, em certa medida, não é ocasionada por qualquer distúrbio nervoso? Assim,
“o corpo corruptível oprime a alma e faz que esta pense muitas coisas”.
4. Mas isto se dá somente em ocasião de doença ou de perturbação morbosa? Não, mas, em todos os tempos, em escala maior ou menor, mesmo quando haja perfeita saúde. Que o homem seja de boa saúde-ainda assim, ele mais ou menos será, como delirante uma vez em cada espaço de vinte e quatro horas. Ora, ele não dorme? E, enquanto dorme, não está sujeito a sonhar? E quem é então senhor dos próprios pensamentos, ou será capaz de preservar a ordem ou a coerência entre eles? Quem poderá então mantê-los fixos num ponto, ou evitar que eles errem de pólo a pólo?
5. Suponha-se que estejamos despertos: estaremos sempre tão despertos que possamos governar perfeitamente nossos pensamentos? Não estamos inevitavelmente expostos aos extremos contrários, pela própria natureza desta máquina – o corpo? Algumas vezes estamos demasiadamente entorpecidos, demasiadamente pesados e lânguidos para seguir determinada cadeia de pensamentos. Outras vezes, por outro lado, estamos demasiadamente vibrantes. A imaginação, sem pedir licença, corre para diante para trás e leva— nos daqui para acolá, quer queiramos, quer não; e tudo isso meramente pelo movimento natural das excitações ou da vibração dos nervos.
6. Mais ainda: quantos desvios do pensamento podem resultar das varias associações de nossas idéias, feitas inteira-mente sem nosso conhecimento e independentemente de nossa escolha? Como se fazem essas associações, não podemos dizê-lo; entretanto elas se formam de mil modos diversos. Nem está nas mãos do mais santo dos homens romper essas associações ou impedir aquilo que constitui suas necessárias conseqüências e em ser matéria de observação diária. Toque o fogo somente a ponta do estopim —e ele imediatamente alcançará a outra extremidade.
7. Outra observação: fixemos nossa atenção, em estudo tão atento quanto pudermos, sobre um dado assunto; se surgir algum prazer ou pena, especialmente se for de certa intensidade, nossa atenção será imediatamente desviada, sendo nosso pensamento arrastado por esse prazer ou por essa dor. Interromper-se-á a mais profunda contemplação, desviando —se a mente de seu objeto favorito.
8. As ocasiões de pensamentos inconstantes partem do íntimo, sendo operadas por nossa própria natureza. Elastambém se levantarão, todavia, natural e necessariamente, dos vários estímulos dos objetos exteriores. Aquilo que fere algum órgão dos sentidos —os olhos ou os ouvidos —provoca uma percepção mental. Conseqüentemente, aquilo que vemos ou ouvimos quebrará nossa primitiva cadeia de pensamentos. Todo homem, pois, que faz alguma coisa à nossa vista ou diz alguma coisa a nossos ouvidos, ocasiona um desvio maior ou menor em nossa mente, tirando-a do ponto com que antes estava preocupada.
9. E não há dúvida que os espíritos maus, que estão constantemente buscando a quem possam tragar, servem — se de todas as ocasiões mencionadas para nos confundir e distrair a mente. Algumas vezes por um, outras vezes, por outro desses meios, eles nos fustigam e nos atormentam, e, na medida que Deus permite, interrompem nossos pensamentos, especialmente quando estes se acham empenhados em melhores assuntos. Nem isto é de todo estranho: eles bem conhecem as próprias fontes do pensamento e sabem de qual dos órgãos corporais a imaginação, o entendimento e todas as demais faculdades da mente mais imediatamente dependem. E daí eles sabem que afetando de certa maneira esses órgãos, afetam as operações que dependem deles. Aduza-se a isso que os maus espíritos podem infundir um milhar de pensamentos, sem qualquer dos meios precedentes, sendo tão natural ao espírito atuar sobre o espírito como à matéria agir sobre a matéria. Consideradas estas coisas, não podemos admirar-nos de que nosso pensamento se desgarre com tamanha freqüência do ponto que tínhamos em vista considerar.
III
1. Que espécie de pensamentos inconstantes são pecaminosos ou não o são — é o terceiro ponto a ser investigado. E, primeiro, todos os pensamentos que se desviam de Deus,que lhe não reservam lugar na mente, são indubitavelmente pecaminosos. Porque tudo isso implica em ateísmo prático —e por esta causa estamos sem Deus no mundo. E muito mais o são todos os que se mostram contrários a Deus, os que implicam em inimizade ou oposição a Ele. Tais são todos. os pensamentos de murmuração, de descontentamento, que na realidade dizem: “Não queremos que nos governes”; todos os pensamentos de incredulidade em relação a seu ser, seus atributos ou sua providência. . Quero dizer sua providêncIa particular sobre todas as coisas, assim como sobre todas as pessoas do universo; providência sem a qual “nem um pardal cal sobre o solo”, pela qual até “os nossos cabelos estão todos contados”; porque, quanto à providência geral, (vulgarmente assim chamada), distinguindo-se de uma providência particular, é somente uma expressão decente, sonora, mas que nenhum significado possui.
2. Mais: todos os pensamentos que defluem das tendências pecaminosas são inegavelmente pecaminosos. Tais são, por exemplo, os que decorrem de um caráter vingativo, do orgulho, da concupiscência ou da vaidade. “Uma árvore má não pode dar bons frutos”; portanto, se a árvore for má, assim também devem ser os seus frutos.
3. E assim devem ser os que produzem ou alimentam qualquer tendência pecaminosa; aqueles que dão lugar ao orgulho ou a vaidade, à ira ou ao amor do mundo, ou confirmam e incrementam aquelas ou quaisquer outras inclinações ímpias, paixões ou afeições. Porque não somente o que procede do mal é mau, mas também o é o que conduz ao mal, o que tende a afastar a alma de Deus e torná-la ou conservá-la mundana, sensual e diabólica.
4. Daí, mesmo os pensamentos que são ocasionados pela fraqueza ou doença, pelo mecanismo natural do corpo ou pelas leis da união vital, por mais inocentes que possam ser em si mesmos,tornam — se, não obstante pecaminosos, quando produzem, estimulam ou aumentam em nós qualquer pendor pecaminoso, como, por exemplo, a cobiça da carne, a cobiça dos olhos ou a vaidade da vida. Do mesmo modo, os pensamentos inconstantes que são ocasionados pelas palavras e ações de terceiros, se eles causam ou alimentam qualquer disposição má, então, começam a ser pecaminosos. Os mesmos podemos observar em relação aos que são sugeridos ou inoculados pelo diabo. Quando tais pensamentos servem a qualquer tendência terrena ou demoníaca (o que fazem, se damos lugar a eles e por este meio deles nos assenhoreamos), então vêm a ser, igualmente, tão pecaminosos como as tendências a que servem.
5. Mas, abstraindo-nos desses casos, os pensamentos inconstantes, no último sentido da palavra, isto é, os
pensamentos graças aos quais nosso entendimento se desgarra do ponto que tinha em vista considerar, não são mais pecaminosos do que o movimento do sangue em nossas veias ou dos humores em nosso cérebro. Se eles procedem de uma constituição enfer-miça ou de alguma fraqueza ou distúrbio acidental, são tão inocentes como o fato de ter-se uma constituição fraca ou Um organismo combalido. E certamente ninguém duvida de que o mau estado dos nervos, a febre de qualquer caráter e mesmo um delírio passageiro ou crônico, seja consistente com a perfeita inocência. Se essas perturbações se manifestarem em uma alma que esteja unida a um corpo enfermo, seja pela relação natural da alma com o corpo ou por quaisquer alterações que, aos milhares, possam ocorrer nos órgãos que servem ao pensamento, este, será, em qualquer daqueles casos, tão perfeitamente inocente como as causas de que decorre. Assim são os pensamentos que resultam da associação fortuita, involuntária, de nossas idéias.
6. Se nossos pensamentos fogem do ponto que lhes estava proposto, por meio de outros homens que de vários modos afetam nossos sentidos, tais pensamentos são ainda igualmente inocentes, porque não há maior pecado em entender o que vejo ou ouço, e que em muitos casos não posso deixar de ver, ouvir e entender, do que no fato de eu possuir olhos, e ouvidos. “Mas se o diabo inculca pensamentos inconstantes, estes pensamentos não são maus?” Eles são perturbadores e, neste sentido, são maus; mas não são pecaminosos. Não sei que ele tenha falado a nosso Senhor em voz audível; ta1vez houvesse falado Somente a seu coração, ao dizer: “Todas estas coisas te darei se, prostrado, me adorares”. Mas, quer tivesse falado interior ou exteriormente, nosso Senhor indubitavelmente ouviu o que lhe disse o maligno. Teve, pois, pensamentos correspondentes àquelas palavras. Mas estes pensamentos foram pecaminosos? Sabemos que não foram. Nele não havia pecado, nem em ação, nem em pa1avra ou pensamento. Nem há pecado em um milhar de pensamentos da mesma” espécie, que Satanás pode inculcar em qualquer dos seguidores de nosso Senhor.
7. Segue-se que nenhum desses pensamentos inconstantes (conquanto pessoas inconsideradas afirmem ter sido afligidas por causa deles, quando o Senhor os não af1igiu), é inconsistente com o perfeito amor. Na verdade, se o fosse, então não só as dores cruciantes, mas até o próprio sono, seriam também inconsistentes com aquele amor, porque, sobrevindo essas coisas, qualquer que fosse o objeto em que pensássemos, nosso pensamento se interromperia e vertiginosamente seria encaminhado para outro rumo: e ainda o próprio sono, por ser um estado de insensibilidade e estagnação, daria lugar a esse resultado, já que geralmente se associa a pensamentos que vagueiam sobre a terra, desordenados, selvagens e incoerentes. Todavia, esses pensamentos são consistentes com operfeito amor: e assim o são todos os pensamentos inconstantes dessa espécie.

IV

1. Do que se tem observado, é fácil dar clara resposta à. última pergunta: De que espécie de pensamentos
inconstantes podemos esperar ser libertados e orar neste sentido?
Da primeira espécie de pensamentos inconstantes —aqueles pelos quais o coração se desvia de Deus; de todos quesão contrários à sua vontade ou” que nos deixam sem Deus no mundo, o que é aperfeiçoado em amor indubitavelmente se liberta. Tal libertação podemos, portanto, esperá-la; por essa libertação podemos e devemos orar. Os pensamentos inconstantes dessa espécie implicam em incredulidade, senão em inimizade para com Deus; mas Ele destruirá a uma e outra e porá fim completo a todos eles. E, realmente, de todos os pensamentos que são pecaminosos, seremos absolutamente libertados. Todos os que são aperfeiçoados em amor serão libertados deles; de outro modo não seriam salvos do pecado. Os homens e os demônios os tentarão por todos os meios; mas não poderão prevalecer.
2. Em relação à última espécie de pensamentos inconstantes, o caso é muitíssimo diferente. Enquanto a causa não for removida, não podemos com boas razões esperar que cessem Os efeitos. Mas as causas ou ocasiões de tais pensamentos permanecerão enquanto permanecermos no corpo. Enquanto isto se verificar, temos toda razão para crer que os efeitos também permanecerão.
3. Para focalizar o assunto de modo mais particular: suponha-se que uma alma, embora santa, habite um corpo combalido; suponha-se que o cérebro esteja completamente desorganizado, de modo que a esse estado suceda furiosa loucura; Os seus pensamentos não serão selvagens e desconexos, enquanto durar aquela desordem? Suponha-se que uma febre ocasione essa loucura temporária, que chamamos “delírio”, pode haver qualquer concatenação de pensamentos enquanto o delírio não for debelado? Sim, suponha-se que o que se chama “perturbação nervosa” chegue a tão alto grau, que determine, no mínimo, um estado de semi loucura; não haverá, então, milhares de variações de pensamento? E esses pensamentos disparatados não devem continuar, enquanto subsistir a desordem que os determina?
4. O caso não será o mesmo em relação aos pensamentos que se formulam sob a ação de dores violentas? Eles mais ou menos continuarão, enquanto durarem aquelas penas, e isto por inevitável imposição da natureza. Tal imposição, de igual modo, prevalecerá, nos casos em que os pensamentos sejam conturbados, fragmentados ou interrompidos por qualquer defeito de apreensão, juízo ou imaginação, oriundo da constituição natural do corpo. E quantas interrupções podem resultar da inexplicável e involuntária associação de nossas idéias! Todas elas são, porém, direta ou indiretamente causadas pela pressão feita sobre a mente pelo corpo corruptível. Nem podemos, entretanto, esperar que elas sejam removidas, até que “este corpo corruptível seja revestido de incorrupção”.
5. Somente então, quando dormirmos no pó, seremos libertados dos pensamentos inconstantes ocasionados por aquilo que vemos e ouvimos, em meio daqueles que nos rodeiam. Para evitar Isto seria necessário sairmos do mundo, porque, enquanto per-manecermos nele, enquanto homens e mulheres estiverem à volta de nós, e tivermos olhos para ver e ouvidos para ouvir, as coisas que vemos e ouvimos diariamente por certo que nos afetarão a mente, e mais ou menos quebrarão e interromperão a seqüência de nossos pensamentos.
6. Enquanto os espíritos maus errarem para diante e para trás em um mundo miserável, desordenado, eles
assaltarão (quer possam prevalecer, quer não possam), a todo habitante da carne e do sangue. Perturbarão mesmo àqueles a quem não possam destruir: atacarão ainda que não consigam vencer. E dos ataques de nossos
infatigáveis, incansáveis inimigos, não devemos esperar inteira libertação, até que sejam alojados lá “onde os maus cessam de perturbar e onde os fatigados estão em repouso”.
7. Para resumir tudo: esperar libertação dos pensamentos inconstantes que são ocasionados pelos maus espíritos é o mesmo que esperar que” o diabo morra ou adormeça: ou, pelo menos, não mais vagueie em torno, como leão rugidor. Esperar libertação dos que são ocasionados por outros homens, é o mesmo que esperar que estes sejam cortados da terra ou que sejamos absolutamente segregados do meio deles e com eles não tenhamos nenhum contacto; ou que, tendo olhos, não vejamos, nem ouçamos com nossos ouvidos, mas sejamos tão insensíveis como paus ou pedras. E orar pela libertação dos pensamentos ocasionados pelo corpo é com efeito, orar por que deixemos o corpo; de outro modo seria orar por impossibilidades e absurdo- orando por que Deus reconcilie mcontradições, por que continue nossa união com o corpo corruptível, sem as conseqüências naturais, necessárias, dessa união. É como se nós orássemos por que fôssemos ao mesmo tempo anjos e homens, mortais e imortais. Não! Mas, quando vier a imortalidade, esvair-se-á a mortalidade!
8. Oremos, antes, com o espírito e o entendimento, para que todas essas coisas possam cooperar para nosso bem; para que possamos suportar todas as enfermidades de” nossa natureza, todo os tropeços ocasionados pelos homens, todos os assaltos e sugestões dos maus espíritos, saindo em tudo “mais do que vencedores”. Oremos para” que possamos ser libertados de todo pe-cado; para que sua raiz e seus ramos sejam destruídos; para que sejamos “purificados de toda contaminação da carne e do espírito”, de toda tendência, palavra ou obra má; para que Possamos “amar o Senhor nosso Deus de todo nosso coração, de toda nossa mente, de toda nossa alma, e de toda nossa força”“; para que todos os frutos do Espírito se encontrem em nós — não somente o amor, o gozo e a paz, mas também “longanimidade, doçura bondade, fidelidade, mansidão, temperança”. Oral para que todas estas coisas possam florescer e abundar, possam multiplicar — se em cada um de vós cada vez mais, até que uma entrada franca vos seja proporcionada no reino eterno de nosso Senhor Jesus Cristo!

sábado, 3 de outubro de 2009

Sobre a Providência Divina


SOBRE A PROVIDÊNCIA DIVINA
"E até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados. Não temais, pois; mais valeis vós do que muitos passarinhos". (Lucas 12:7)
1. A doutrina da providência divina tem sido recebida pelos homens sábios em todas as épocas. Muitos dos eminentes pagãos acreditaram, não apenas os filósofos, mas oradores e poetas. Inumeráveis são os testemunhos concernentes a ela que são espalhadas aqui e ali, nos escritos deles; de acordo com o bem conhecido dizer em Cícero Deorum moderamine cuncta geri"Todas as coisas, todos os eventos neste mundo estão sob a direção de Deus"Nós traríamos uma nuvem de testemunhos para confirmar isto, fosse algum tão ousado, a ponto de negá-la.
2. A mesma verdade é reconhecida hoje, na maior parte do mundo; sim, até mesmo, por aquelas nações que são tão bárbaras, de maneira a não conhecerem o uso das letras. Assim, quando se perguntou a Paustoobee, um chefe Índio, do Chicasaw, nação da América do Norte: "Por que vocês pensam que O Amado (assim eles denominam Deus) cuida de vocês?", ele respondeu, sem qualquer hesitação: "Eu estive na batalha com a França; e a bala passou por este lado; e este homem morreu, e aquele homem morreu; mas eu estou vivo ainda; e por isto eu sei que O Amado cuida de mim".
3. Mas, embora os antigos, assim como os modernos pagãos têm alguma concepção da divina providência, ainda assim, as concepções que a maioria deles toma em consideração, concernente a isto eram obscuras, confusas, imperfeitas. Sim, os relatos do mais instruído entre eles, eram usualmente contraditórios uns com os outros. Acrescente a isto, que eles estavam, de modo algum, seguros da verdade daqueles mesmos relatos: Eles dificilmente se atreveram a afirmar alguma coisa, mas falaram com a mais extrema precaução e difidência; de tal maneira, que o próprio Cícero; o autor daquela nobre declaração se aventura a afirmar, a sangue frio, no final de sua longa disputa sobre o assunto, resulta em não mais do que esta falha e impotente conclusão: Mihi verisimilior videbatur Cotta oratin:"O que Cotta disse", (A pessoa que argumentou na defesa da existência e providência de Deus) "pareceu a mim mais provável do que o que seu oponente tinha avançado ao contrário".
4. E não é de se surpreender: Porque apenas o próprio Deus pode dar um relato claro, consistente, perfeito (ou seja, tão perfeito quanto nosso entendimento fraco pode receber, neste nosso estado infantil de existência; ou, pelo menos, como é consistente com os desígnios do seu governante), de sua maneira de governar o mundo. E isto Ele tem feito em sua palavra escrita: Todos os oráculos de Deus, todas as Escrituras, ambas do Velho Testamento e Novo, descrevem tantas cenas da providência divina. É uma bonita observação de um fino escritor: "Aqueles que objetam o Velho Testamento, em específico, como não estando ligado à história das nações, mas apenas às agregações de eventos quebrados, desconectados, não observam a natureza e objetivo desses escritos. Eles não vêem que as Escrituras são a história de Deus". Aqueles que pensam assim facilmente perceberão que os escritores inspirados nunca perderam isto de vista, a não ser preservar uma cadeia inteira, e ligada do começo ao fim. Tudo sobre aquele livro maravilhoso, como "a vida e imortalidade" (vida imortal) é gradualmente "trazida ao conhecimento", assim é Emanuel, Deus conosco, e seu reino sobre todos.
5. Nós versos precedentes, o texto, nosso Senhor tem armado seus discípulos contra o temor do homem: "Não tema", diz Ele, (verso 4)"aqueles que podem matar o corpo, e depois disto, nada mais que podem fazer". Ele os protege contra este medo, primeiro, lembrando-os do que era infinitamente mais terrível do que alguma coisa que o homem poderia infligir: "Tema a Ele, que depois que mata, tem o poder de lançar no inferno". Ele os protege mais além, contra isto, pela consideração de uma providência governante: "Cinco pardais não são vendidos por duas farthings [moeda inglesa de ¼ de pêni], e nenhum deles é esquecido diante de Deus?".  Ou, como as palavras são repetidas por Mateus, com a mesma variação insignificante (10:29-30) " Não se vendem dois passarinhos por um ceitil? e nenhum deles cairá em terra sem a vontade de vosso Pai. E até mesmo os cabelos da vossa cabeça estão todos contados".
6. Nós devemos, de fato, observar que esta forte expressão, embora repetida, por ambos os Evangelistas, não precisa implicar (embora, se alguém pensar que sim, ele pode pensar muito inocentemente), que Deus literalmente numera os cabelos que estão nas cabeças de todas as suas criaturas. Mas trata-se de uma expressão proverbial, implicando que nada é tão pequeno ou insignificante, às vistas dos homens, de maneira a não ser um objeto do cuidado e providência de Deus, diante de quem nada é pequeno quando diz respeito à felicidade de alguma de suas criaturas.
7. Escassamente existe alguma doutrina em todo o compasso da revelação, que seja de importância tão mais profunda do que isto. E, ao mesmo tempo, existe escassamente alguma que seja tão pouco cuidada, e talvez, tão pouca compreendida. Vamos nos esforçar, então, com a assistência de Deus, para examiná-la em sua profundidade; para ver junto a qual fundamento ela se situa, e o que propriamente implica.
8. O eterno, poderoso, todo-sábio, todo-gracioso Deus é o Criador do céu e terra. Ele chamou do nada, através de sua palavra toda-poderosa, todo o universo, tudo que existe. "Assim, os céus e terra foram criados, e toda a multidão de homens". E, depois, Ele estabeleceu todas as coisas mais, em uma ordem; as plantas, segundo os tipos; peixes e pássaros; bestas e répteis, segundo suas espécies. "Ele criou o homem, segundo sua própria imagem". E o Senhor viu que toda parte distinta do universo era boa. Mas, quando viu tudo que tinha feito, tudo que estava em ligação uns com os outros, "observou que isto era muito bom".
9. E como este todo sábio, todo gracioso Ser criou todas as coisas, então, Ele mantém todas coisas. Ele é o Preservador, assim como, o Criador de tudo que existe. "Ele sustenta todas as coisas, através da palavra de seu poder", ou seja, através da sua palavra poderosa. Agora Ele deve conhecer todas as coisas que Ele fez, e todas as coisas Ele preserva, de tempos em tempos; do contrário, Ele não poderia preservá-las; Ele não poderia continuar a dar o que Ele tem dado. E não é nada estranho que Ele que é Onipresente, que "preenche céus e terra"; que está intimamente presente. Se o olho do homem discerne coisas a uma pequena distância; o olho de uma água, que está a uma maior; o olho de um ângulo, que está mil vezes a uma distância maior (talvez, tomando a superfície da terra em um só olhar); como o olho de Deus não deverá ver tudo, através de toda a extensão da criação? Especialmente considerando que nada está distante Dele, em quem nós todos "vivemos, e nos movemos e temos nossa existência".
10. É verdade, que nossos entendimentos estreitos compreendem, a não ser imperfeitamente isto. Mas quer compreendamos ou não, estamos certo de que assim é. Tão certo quanto foi Ele que criou todas as coisas, e que Ele ainda mantém tudo que é criado; tão certo quanto Ele está presente, em todos os tempos; em todos os lugares; acima, abaixo; que Ele "nós observa por trás e pela frente", e, por assim dizer, "coloca suas mãos sobre nós". Nós admitimos que "tal conhecimento é muito alto", e maravilhoso para nós; nós "não podemos alcançá-lo". A maneira de sua presença, nenhum homem pode explicar, nem, provavelmente, algum anjo no céu. Talvez, o que o filósofo antigo fala da alma, com respeito à sua residência no corpo, que ela é tota in toto, et, tota in qualibet parte, poderia, em algum sentido, falar-se do Espírito onipresente, com respeito a todo o universo: Que Ele não é apenas"Tudo no todo", mas "Tudo em cada parte".  Seja isto como for, não se pode duvidar que Ele vê todo átomo de Sua criação, e isto milhares de vezes mais claramente do que vemos as coisas que são próximas a nós: Mesmo aquelas em que vemos apenas a superfície, enquanto Ele vê a essência interior de cada coisa.
11. O Deus Onipresente vê e sabe todas as propriedades dos seres que Ele fez. Ele conhece todas as conexões, dependências, e relações, e todos os caminhos em que um deles pode afetar o outro. Em específico, Ele vê todas as partes da criação inanimada, quer no céu, ou na terra. Ele sabe como as estrelas, cometas, ou planetas influenciam os habitantes da terra; que influência os céus mais baixos, com seus periódicos de fogo, granizo, neve, vapores, ventos, e tempestades, têm sobre nosso planeta; e que efeitos pode ser produzido nas entranhas da terra, pelo fogo, ar, ou água; quais exalações podem surgir daquilo, e que mudanças forjadas, por meio delas; quais efeitos todo mineral ou vegetável podem ter junto aos filhos dos homens: Todos esses se colocam nus e abertos aos olhos do Criador e Preservador do universo.
12. Ele conhece todos os animais do mundo inferior, quer sejam bestas, pássaros, peixes, répteis ou insetos: Ele conhece todas as qualidade e poderes que Ele deu a eles, do mais alto ao mais baixo: Ele conhece todo anjo bom e anjo mal, em toda parte de seus domínios e olha do céu para os filhos dos homens, sobre toda a face da terra. Ele conhece todos os corações dos filhos dos homens e entende todos os seus pensamentos: Ele vê o que algum anjo, algum demônio, algum homem pensa, fala, ou faz; sim, e tudo que eles sentem. Ele vê todos os sofrimentos deles, com todas as circunstâncias deles.
13. E o Criador, o Preservador do mundo está despreocupado com o que Ele vê nele? Ele olha para essas coisas com um olho nocivo ou descuidado? Ele é um deus epicurista? Ele se senta confortável no céu, sem se preocupar com os pobres habitantes da terra? Não pode ser. Ele nos fez, não nós a nós mesmos; e ele não pode menosprezar a obra de suas próprias mãos. Nós somos seus filhos: E pode uma mãe esquecer os filhos de seu ventre? Sim, ela pode esquecer; ainda assim, Deus não irá nos esquecer! Do contrário, ele tem expressamente declarado que, como seus"olhos estão sobre toda a terra", então, Ele "é amoroso com todo homem, e Sua misericórdia está sobre todas as suas obras". Conseqüentemente, ele está preocupado, a todo o momento, pelo que sobrevém a toda criatura sobre a terra; e, mais especialmente, por todas as coisas que sobrevém a alguns dos filhos dos homens. É difícil, de fato, compreender isto, é difícil acreditar nisto, considerando a maldade e a miséria, intricadas, que vemos de todos os lados. Mas nós devemos acreditar nisto, a menos que façamos de Deus um mentiroso; embora seja certo que nenhum homem pode compreender isto. Cabe a nós, então, nos humilharmos diante de Deus, e reconhecer nossa ignorância. Na verdade, como podemos esperar que um homem possa ser capaz de compreender um verme? Quanto menos se pode supor que um homem possa compreender a Deus!
Por que, como pode o finito medir o infinito?
14. Ele é infinito em sabedoria, assim como em poder: E toda Sua sabedoria está continuamente empregada em manejar todos os assuntos de Sua criação para o bem de todas as Suas criaturas. Porque Sua sabedoria e bondade seguem de mão em mão: Elas estão inseparavelmente unidas, e continuamente agem em concerto com o poder Altíssimo, para o bem verdadeiro de todas as Suas criaturas. Seu poder, sendo igual a Sua sabedoria e bondade continuamente coopera com elas. E para Ele todas as coisas são possíveis: Ele faz o que quer que lhe agrade, no céu e terra, e no mar, e todos os lugares profundos: E nós não podemos duvidar de Seu exercer todo Seu poder, como no sustentar, assim no governar, tudo que Ele fez.
15. Apenas ele que pode fazer todas as coisas, antes, não pode negar a si mesmo: Ele não pode contrariar a si mesmo, ou opor-se à sua própria obra. Não fosse por isto, ele destruiria todo o pecado, com sua dor concomitante, imediatamente. Ele aboliria a maldade de toda sua criação, e completamente subverteria toda sua própria obra, e desfaria tudo que ele tem feito, desde que Ele criou o homem sobre a terra. Porque Ele criou o homem, em sua própria imagem: Um espírito como Ele mesmo; um espírito dotado com entendimento, com vontade ou afeições, e liberdade; sem o que, nem seu entendimento, nem suas afeições, teriam sido de algum uso, nem ele teria sido capaz quer dos maus hábitos ou da virtude. Ele não poderia ser um agente moral, não mais do que uma árvore ou uma pedra. Se, portanto, Deus fosse assim para mostrar seu poder, certamente não mais haveria maus hábitos, mas, é igualmente certo que nem haveria alguma virtude no mundo. Fosse a liberdade do homem tirada, os homens seriam tão incapazes da virtude, quanto as pedras. Portanto (com reverência seja isto falado), o próprio Altíssimo não pode fazer isto. Ele não pode contradizer-se, ou desfazer o que fez. Ele não pode destruir, da alma  do homem, aquela imagem de si mesmo, na qual Ele o fez: E, sem fazer isto, ele não pode abolir o pecado e dor do mundo. Mas fosse isto para ser feito, implicaria em nenhuma sabedoria, afinal; mas meramente uma façanha da Onipotência. Considerando que toda as múltiplas sabedorias de Deus (assim como todo seu poder e bondade) está colocado no governar o homem como homem; não como um bloco ou pedra, mas como um espírito inteligente e livre, capaz de escolher o bem ou o mal. Nisto, aparece a profundidade da sabedoria de Deus, em sua providência adorável; no governar os homens, de maneira não a destruir, quer o entendimento deles, vontade, ou liberdade. Ele comanda todas as coisas, ambos no céu e terra; para assistir o homem no ater a finalidade de sua existência, no operar sua própria salvação, até onde ela pode ser feita, sem compulsão, sem governar sua liberdade. Um inquiridor atento pode facilmente discernir, toda a estrutura da providência divina é tão constituída quanto a fornecer ao homem toda possibilidade de ajuda, com o objetivo de seu fazer o bem e evitar o mal, que pode ser feito, sem transformar o homem em uma máquina; sem torná-lo incapaz da virtude ou maus hábitos, recompensa ou punição.
16. Neste meio tempo, tem sido notado, por um escritor devoto, que aqui está, como ele expressa isto, um círculo triplo da providência divina, além daquele que preside sobre todo o universo. Nós agora não falamos daquela mão governante que dirige a criação inanimada; que mantém o sol, lua, e estrelas em suas situações, e guia seus movimentos; nós não nos referimos ao seu cuidado, com a criação animal; toda parte da qual nós sabemos está sob o governo Dele, "quem dá alimento para o gado, e os jovens corvos que chamam por ele"; mas nós aqui falamos daquela providência superintende que cuida dos filhos dos homens. Cada um desses é igualmente distinguido do outro, por aqueles que corretamente observam os caminhos de Deus. O círculo externo inclui toda a raça humana; todos os descendentes de Adão; todas as criaturas humanas que estão dispersas sobre a face da terra. Isto inclui não apenas o mundo cristão, aqueles que são chamados pelo nome de Cristo, mas os maometanos também, que consideravelmente excedem, até mesmo, os cristãos nominais; sim, e os pagãos igualmente, que muito além excedem os maometanos e cristãos, colocados juntos. "Ele é o Deus dos judeus", diz o Apóstolo, "e não dos gentios também?".  E, assim, nós podemos dizer: Ele é o Deus dos cristãos, e não dos maometanos e ateus? Sim, indubitavelmente, dos maometanos e pagãos também. Seu amor não está confinado: "O Senhor é amor junto a todo homem e sua misericórdia está sobre todas as suas obras".  Ele cuida dos homens proscritos: Verdadeiramente pode ser dito:
Livres, como o ar tuas generosidades fluem, sobre todas as tuas obras: Os feixes de luz de tuas misericórdias, difusos, como o nascer do sol.
17. Ainda assim, pode-se admitir que Ele toma um cuidado mais imediato com aqueles que estão compreendidos no segundo; no círculo menor; que inclui todos que são chamados cristãos; todos que professam acreditar em Cristo. Nós podemos razoavelmente pensar que esses, em algum grau, honram a ele, pelo menos, mais do que os pagãos o fazem: Deus igualmente, em alguma medida, honra a eles, e tem uma preocupação mais próxima por eles. Através de muitas instâncias, parece que o príncipe deste mundo não tem completo poder sobre esses, assim como sobre os pagãos. O Deus a quem eles professam sempre servir, em alguma medida, mantém sua própria causa; de modo que os espíritos da escuridão não reinam tão incontroláveis sobre eles, assim como eles fazem sobre o mundo pagão.
18. Dentro do terceiro, no circulo mais interior, estão contidos apenas os cristãos reais; aqueles que adoram a Deus, não na forma apenas, mas em espírito e em verdade. Aqui estão incluídos todos que amam a Deus, ou, pelo menos, verdadeiramente temem a Deus e operam retidão; todos em quem está a mente que estava em Cristo, e caminham como Cristo também caminhou. As palavras de nosso Senhor acima citadas peculiarmente se referem a esses. É a esses, em especial que ele diz? "Até mesmo os cabelos de sua cabeça são todos numerados". Ele vê suas almas e seus corpos; ele toma peculiar cuidado de todos os temperamentos, desejos e pensamentos; todas as suas palavras e ações. Ele assinala todos os seus sofrimentos, interiores e exteriores, e a busca de onde eles surgem; de modo que podemos bem dizer:
Tu conheces as dores que teu servo sente,
Tu ouves o choro de teus filhos,
E seus melhores desejos para cumprir,
Tua graça está sempre por perto.
Nada relativo a esses é tão grande; nada tão pequeno, para a atenção Dele. Ele tem seus olhos continuamente, como que junto a toda pessoa, em particular, que é membro desta sua família; como junto a toda a circunstância que se refere, tanto às suas almas ou corpos; tanto ao estado interior quanto exterior; onde tanto a felicidade presente quanto eterna é, em algum grau, participante.
19. Mas o que dizem os homens sábios do mundo a isto? Eles respondem, com toda prontidão: "Quem duvida disto? Nós não somos ateístas. Nós todos reconhecemos a providência: Ou seja, a providência geral; porque, de fato, a providência específica, da qual alguns falam. Nós não conhecemos do que é feita: Certamente os pequenos assuntos dos homens estão longe do cuidado do grande Criador e Governador ou do universo! Assim sendo: Ele vê com olhos iguais, como Senhor de todos, um herói que perece e um pardal que cai".
Ele o faz, de fato? Eu não posso pensar isto; porque (o que quer que aquele fino poeta fez, ou seu patrão, a quem ele tão profundamente menosprezou, e ainda assim, grosseiramente lisonjeou), eu acredito na Bíblia, em que o Criador, ou Governador do mundo, me diz completamente o contrário. Que ele tem um cuidado terno por estas criaturas, eu sei: Ele o faz em parte: "toma cuidado com o rebanho": Ele "providencia alimento para o gado", assim como para "os vegetais para o uso dos homens".  "Os leões rosnando em busca de sua presa, buscam pelo seu alimento, de Deus". "Ele abre sua mão, e preenche todas as coisas vivas com abundância".
            Os vários bandos do mar e terra
            Com respeito à necessidade comum, concordam;
            Todos esperam tua mão que distribui
            E têm seus donativos diários de ti.
            Eles reúnem o que teus estoques dispersam.
            Sem a preocupação deles de prover;
            Tu abres tua mão; o universo,
            O mundo, em súplica, é todo suprido. 
Nosso Pai celeste alimenta as aves do ar: Mas assinale! "Você não é muito melhor do que eles?". Ele, então, não"alimenta muito mais você", que é proeminente, através de tantas vantagens? Ele, neste sentido, não olha para você e eles, "com olhos iguais"; não coloca você no mesmo nível que eles; menos do que tudo, ele não coloca você no mesmo nível que brutos, com respeito á vida e morte: "Preciosa, às vistas do Senhor, é a morte de seus santos". Você realmente pensa que a morte de um pardal é igualmente preciosa às vistas Dele? Ele nos diz, de fato, que "nenhum pardal cai ao solo, sem nosso Pai"; mas ele pergunta, ao mesmo tempo: "Você não tem mais valor do que muitos pardais?".
20. Mas, no suporte de uma providência geral, em contradição com uma específica, o mesmo elegante poeta a escreve como uma máxima inquestionável:
A Causa Universal age, não por leis parciais, mas por leis gerais.
Plenamente significando que Ele nunca se desvia daquelas leis gerais em favor de alguma pessoa em específico. Esta é a suposição comum; mas que é completamente inconsistente com todo o teor das Escrituras: Porque se Deus nunca se desvia dessas leis gerais, então, nunca existiu um milagre no mundo; vendo-se que todo milagre é um desvio das leis naturais. O Altíssimo confinou a si mesmo a essas leis gerais, quando ele dividiu o Mar Vermelho? Quando Ele comandou as águas para se situarem na cabeceira, e fez um caminho para seus remidos passarem? Ele agiu através de leis gerais, quando ele fez com que o sol ficasse parado pelo espaço de todo um dia? Não; nem em alguns dos milagres que estão registrados no Velho e Novo Testamento.
21. Mas é na suposição de que o Governador do mundo nunca se desvia daquelas leis gerais, que o Sr. Pope acrescenta aquelas bonitas linhas em triunfo complete, como tendo agora claramente ganho o ponto: -
Pode o Etna ardente, se o sábio requerer,
Esquecer o trovão, e anular seu fogo?
Sobre o ar ou mar, novos movimentos de serem cedidos
Ó Betel inocente! Para aliviar teu peito!
Quando a montanha solta treme do alto,
Deverá a gravitação cessar, se você se for?
Ou algum velho templo oscilando em sua queda,
Porque a cabeça de Chatre conserva a parede pendente?
Nós respondemos que, se agrada a Deus continuar a vida de algum de seus servos, ele suspenderá esta ou alguma outra lei da natureza: A pedra não deverá cair; o fogo não deverá queimar; a inundação, não deverá fluir; ou, ele dará incumbência a seus anjos, e nas mãos eles, eles deverão segurá-lo, através e acima de todos os perigos!
22. Admitindo, então, que, no curso comum da natureza, Deus não age através de leis naturais, ele nunca impede a si mesmo de fazer exceções a elas, quando quer que lhe agrade; tanto suspendendo aquela lei, em favor daqueles que o amam, ou empregando seus anjos poderosos: Através de ambos os meios, Ele pode livrar de todos os perigos aqueles que confiam Nele.
"O que! Você espera milagres, então?". Certamente, eu sim, se eu acredito na Bíblia: Porque a Bíblia me ensina que Deus ouve e responde oração: Mas cada resposta à oração é, propriamente, um milagre. Porque, se as causas naturais tomam seu curso; se as coisas seguem seu caminho natural, não é resposta, afinal. A gravitação, portanto, deve cessar, ou seja, cessar de operar, quando quer que o Autor se agrade. Os homens do mundo não podem entender essas coisas? Não é de surpreender: Foi observado há muito tempo: "Um homem sem sabedoria não considera isto, e um tolo não entende".
23. Mas eu ainda não terminei com esta mesma providência geral. Pela graça de Deus, eu irei analisá-la até o fundo: E eu espero mostrar que ela é tal absurda tão completo, que qualquer homem consciente deve ficar extremamente envergonhado a respeito.
Você diz: "Você admite uma providência geral, mas nega uma específica". E qual é a geral, de qualquer tipo que seja, que não inclui as especificas? Não é toda geral, necessariamente feita para suas diversas particularidades? Pode você exemplificar alguma geral que não seja? Diga-me algum gênero, se você puder que não contenha variedades? O que é isto que constitui um gênero, a não ser tantas variedades juntas? O que, eu imploro, existe um todo que não contenha partes? Mero absurdo e contradição! O todo, qualquer que seja, deve, na natureza das coisas, ser feito para suas diversas partes; de tal maneira que, se não existem partes, não pode existir todo.
24. Como este é um ponto da mais extrema importância, nós podemos considerar isto um pouco mais além. O que você quer dizer por uma providência geral, distinguida de uma parte? Você quer dizer uma providência que superintende apenas as partes mais largas do universo? Supondo-se o sol, a lua, e estrelas. Isto não diz respeito à terra também? Você admite que sim. Mas isto igualmente não diz respeito aos habitantes dela? Ou, o que a terra, uma massa inanimada de matéria, significa? Não é um espírito, um herdeiro da imortalidade, de um valor maior do quer toda a terra? Sim, embora você acrescente a ela o sol, a luz e as estrelas? Mais do que isto, toda a criação inanimada? Nós não poderíamos dizer: "Esses devem perecer; mas" este "permanecerá: Esses todos deverão apodrecer, como acontece com o vestuário"; mas este (deve ser dito em um sentido menor, até mesmo das criaturas) continua "o mesmo, e seus anos não devem desvanecer-se?". 
25. Ou você quer dizer, quando você afirma uma providência geral; distinta de uma pequena parte, que Deus se preocupa apenas com algumas partes do mundo, e não cuida dos outros? Quais partes Ele cuida? Aqueles foram, ou aqueles dentro do sistema solar? Ou ele se preocupa com algumas partes da terra, e não outras? Quais partes? Apenas aqueles dentro das zonas temperadas? Quais partes, então, estão sob o cuidado da providência Dele? Onde você colocará a linha? Você excluir dela aqueles que vivem nas zonas tórridas? Ou aqueles que habitam dentro dos círculos árticos: Não, antes diga: "O Senhor é amoroso com todo homem", e Seu cuidado "está sobre todas as Suas obras".
26. Você quer dizer (porque nós gostaríamos de nos certificar do seu significado, se você tem algum significado afinal) que a providência de Deus não se estende a todas as partes da terra, com respeito aos grandes e singulares eventos, tais como o surgimento e queda de impérios; mas que a pequena preocupação deste ou daquele homem é indigna da orientação do Altíssimo? Então, você não considera que o grande e pequeno são termos meramente relativos, que têm lugar apenas com respeito aos homens. Com respeito ao Altíssimo, o homem e todas as preocupações dos homens são nada, menos do que nada, diante Dele. E nada é pequeno, às vistas deles, que, em algum grau, afete o bem-estar de alguém que teme a Deus e opera retidão. O que se torna, então, da providência geral, exclusiva de uma partícula? Que seja, para sempre rejeitado por todos os homens racionais, como absurdo, um absurdo autocontraditório. Nós podemos, então, resumir toda a doutrina bíblica naquelas belas palavras de Agustinho: Ita praesidet singulis sicut universis, et universis sicut singulis!
            Pai, quão amplamente tua glória brilha,
            Senhor do universo e meu!
            Tua bondade observa o todo
            Como se todo o mundo fosse uma só alma;
            Como se eu permanecesse em teu cuidado, único!
27. Nós aprendemos deste panorama resumido da providência de Deus, Primeiro, a colocar toda a nossa confiança Nele, que nunca falhou com aqueles que o buscam. Nosso abençoado Senhor, ele mesmo, fez uso da grande verdade agora diante de nós. "Não tema, portanto": Se você verdadeiramente teme a Deus, você não precisa temer ninguém além. Ele será uma torre forte para todo que confia Nele, diante da face de seus inimigos.  O que existe, tanto no céu, quanto na terra, que pode causar mal a você, enquanto você está sob o cuidado do Criador e Governador do céu e terra! Que toda a terra e todo o inferno combinem contra vocês; sim, e toda criação animada e inanimada; eles não podem lhe causar dano, enquanto Deus está do seu lado: Sua delicadeza favorável cobre você como um escudo.
28. Proximamente aliada a esta confiança em Deus, está a gratidão que devemos por sua carinhosa proteção. Que aqueles aos quais o Senhor assim livra das mãos de todos os seus inimigos dêem graças. Que bênção inexplicável é estar, sob o cuidado especifico Dele que tem todo o poder no céu e terra! Como podemos louvar suficientemente a Ele, enquanto estamos, sob as suas asas, e sua fidelidade e verdade são nossos escudos e proteção!
29. Mas, neste meio tempo, nós devemos tomar o cuidado extremo de caminhar humildemente e intimamente com Deus. Caminhar humildemente: Porque, se você, de alguma forma, rouba de Deus a honra Dele, ao atribuir alguma coisa a si mesmo, as coisas que teriam sido para sua saúde provarão a você uma "ocasião para queda". E caminhar intimamente: Veja que você tem uma consciência nula de ofensa, em direção a Deus e ao homem. Por quanto tempo você fizer isto, você terá o cuidado específico de seu Pai que está no céu. Mas que a consciência do cuidado dele por você, não o torne descuidado, indolente ou preguiçoso: Do contrário, enquanto você é penetrado com aquela verdade profunda, "a ajuda que é feita sobre a terra, Ele mesmo a faz"; seja tão sincero e diligente no uso de todos os meios, como se você fosse seu próprio protetor.
Por fim: Em que condição melancólica, estão aqueles que não acreditam que existe alguma providência; ou, que vêm exatamente para o mesmo ponto, e não um específico! Em qualquer situação que eles estejam, por quanto tempo eles estiverem no mundo, eles estão sujeitos aos inúmeros perigos, que nenhuma sabedoria humana pode prever, e nenhum poder humano pode resistir. E não existe ajuda! Se eles confiam em homens, eles os encontram "enganosos, em suas medidas". Em muitos casos, eles não podem ajudar; em outros, eles não irão. Mas mesmo tão dispostos, eles morrerão: Portanto, a ajuda do homem é vã, e a de Deus está muito acima; fora das vistas deles: Eles não esperam ajuda Dele. Esses modernos epicuristas (como os antigos) aprenderam que...
 
A Causa Universal atua, não por leis parciais, mas gerais.
Ele apenas cuida do próprio grande globo; não de seus insignificantes habitantes. Ele não presta atenção como essas...   
Formigas errantes rastejam, ao acaso, na bolha suspensa no ar.
Quão desconfortável é a situação daquele homem que não tem esperança mais além do que esta! Mas, por outro lado, quão inexplicavelmente "feliz é o homem que tem o Senhor para sua ajuda, e cuja esperança está no Senhor seu Deus!'; que pode dizer: "Eu tenho colocado o senhor sempre diante de mim; porque ele está do meu lado direito, eu não devo me mover!". Portanto, "embora eu caminhe através de do vale da sombra da morte, eu não temerei mal algum: Porque tu estás comigo; tua vara e teu bastão me confortam".
[Editado por Chris Thompson, estudante da Northwest Nazarene College (Nampa, ID), com correções de George Lyons para a Wesley Center for Applied Theology.]